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A efetividade da taxa de juros no controle da inflação de alimentos em questão

Por Rosalvo Ferreira Santos*

A inflação deste ano deve ser superior à registrada em 2024. Uma das razões para o aumento do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), elaborado pelo IBGE, é a forte pressão dos preços dos alimentos[1]. Em março, o IPCA registrou 0,56%, bem abaixo do índice de fevereiro, que foi de 1,31% — ou seja, uma queda de 0,75 ponto percentual (p.p.). No entanto, no acumulado de janeiro a março de 2025, a inflação já atingiu 2,03%. Considerando os últimos 12 meses, o índice acumulado é de 5,48%, acima do limite superior da meta, que é de 4,5%. Em 2024, a inflação alcançou 4,83%, ultrapassando o teto da meta em 0,33 p.p., resultado fortemente influenciado pela valorização do dólar nos últimos meses daquele ano.

Para que a inflação de 2025 se mantenha dentro do limite superior da meta (4,5%), seria necessário que, nos próximos três trimestres, o índice acumulado não ultrapassasse 2,47%, o que implicaria uma inflação mensal média de, no máximo, 0,27%. Essa possibilidade é praticamente nula, considerando que a média mensal do primeiro trimestre de 2025 foi de 0,67%. Considerando os últimos 12 meses, a média mensal do IPCA é de aproximadamente 0,46%. Assim, é quase inevitável que o IPCA de 2025 ultrapasse o índice registrado em 2024.

A nova metodologia adotada pelo Banco Central, conforme expressa no Relatório de Política Monetária (antigo Relatório de Inflação), considera o cálculo da inflação de forma contínua, com base no acumulado dos últimos 12 meses. Nesse contexto, para reduzir o índice dentro da meta, seria necessário elevar a taxa de juros a ponto de suprimir, no mínimo, um ponto percentual do acumulado atual. Isso exigiria que, nos próximos meses, a inflação se aproximasse de zero, ou até apresentasse deflação em algum período.

Embora a inflação afete a todos, seu impacto é mais severo sobre o poder de compra das famílias de menor renda, especialmente quando decorre do aumento dos preços dos alimentos. A tentativa de trazer a inflação para dentro da meta por meio da elevação dos juros impõe um custo social elevado. A principal questão é: a taxa de juros realmente afeta a demanda por alimentos ou apenas provoca uma redução generalizada nos demais preços devido ao desaquecimento da economia como um todo?

Do ponto de vista institucional, qualquer proposta do Conselho Monetário Nacional (CMN) para ampliar os limites da meta de inflação parece inadequada no atual contexto. Assim, resta ao Banco Central, por meio do Comitê de Política Monetária (Copom), manter a trajetória de alta da taxa de juros?

A resposta não é simples. Devido à inelasticidade da oferta de produtos agrícolas no curto prazo, aumentos sazonais de preços são praticamente inevitáveis — a não ser que houvesse estoques reguladores com capacidade suficiente para equilibrar movimentos inesperados de preços. No entanto, além de reduzir a possibilidade de ampliação do mark-up dos produtores, estoques reguladores têm custo operacional elevado e não conseguem contemplar todos os itens da cesta básica utilizada no cálculo do IPCA.

Uma alternativa mais ágil, embora com eficácia limitada, seria a redução das tarifas de importação de produtos com maior impacto na inflação. Para surtir efeito, as importações precisariam ocorrer antes do movimento de aceleração dos preços e os produtos estarem rapidamente disponíveis para os consumidores, especialmente nas localidades onde a inflação se mostrar mais elevada.

De fato, os dados do IBGE revelam que a inflação apresenta comportamento regional diferenciado. No levantamento de março de 2025, observou-se grande variação entre as cidades pesquisadas, seja pela maior participação de determinados itens na cesta de consumo — com pesos relativos maiores no cálculo do índice —, seja por fatores locais que afetaram a oferta. O IPCA foi mais alto em São Paulo (0,71%), Curitiba e Porto Alegre (0,76%), situando-se, respectivamente, 27% e 36% acima do índice nacional. As menores variações ocorreram em Brasília (0,27%), Rio Branco (0,27%), Goiânia (0,31%) e Fortaleza (0,32%). Das 16 cidades pesquisadas, 9 apresentaram IPCA abaixo de 0,50% em março. Não fosse esse desempenho, o índice nacional teria sido ainda maior.

O impacto da inflação de alimentos atinge principalmente as famílias de menor renda, que, para manter o consumo, recorrem inicialmente a bens substitutos — mesmo com perda de qualidade. Quando não há substituição possível, são forçadas a reduzir a quantidade consumida dos produtos mais caros. A perda do poder de compra leva essas famílias a uma condição de maior restrição alimentar. Tal cenário tende a ampliar o número de famílias em situação de vulnerabilidade socioeconômica, com aumento dos casos de insegurança alimentar, desde os mais leves até os mais graves.

Manter a política de juros altos, além de impedir o crescimento econômico, tem como agravante o desequilíbrio das contas públicas, na medida em que eleva o custo da dívida, mesmo com ajustes nas despesas não financeiras. Quanto maior a taxa de juros, maior o esforço fiscal necessário para gerar superávit primário suficiente para cobrir os encargos da dívida. Quais razões justificam elevar a taxa de juros reais a quase duas vezes o índice de inflação, considerando-se que o aumento do custo do crédito reduz o consumo das famílias e impede a realização de novos investimentos? Como, então, superar o trade-off entre controle da inflação e o crescimento da economia brasileira?

A solução não é trivial. Uma medida possível para reduzir o custo social da inflação de alimentos seria a isenção de impostos federais e estaduais sobre os itens da cesta básica para famílias com rendimento de até dois salários mínimos. A compensação poderia ocorrer por meio de tributação sobre o mark-up de empresas que conseguiram diferenciais de preços acima da média. Por conseguinte, a conduta de elevação de preços por motivos especulativos e oportunistas deveria ser combatida por meio de restrições a linhas de crédito vantajosas e perda de tributação específica.

Além disso, o arranjo institucional para combater a inflação de alimentos deveria adotar uma abordagem articulada, com maior coordenação entre os agentes do sistema agroalimentar. Na qual possam ser considerados os microfundamentos econômicos e as relações contratuais que regem as diferentes cadeias produtivas, e cujo enfoque da inflação de alimentos passe a considerar a questão dos custos de transação, bem como as relações institucionais no âmbito das estruturas de mercado que integram o sistema agroalimentar.

Ao se considerar a variação persistente dos preços agroalimentares como um fenômeno de natureza exclusivamente monetário, corre-se o risco de tratar o problema a partir de uma visão limitada, na qual somente há espaço para a elevação da taxa de juros em termos reais, como sendo um mal necessário. O comprometimento dos níveis de emprego e da renda das famílias é o preço que se pagará pelo uso discricionário da taxa de juros por parte do Banco Central. Por sua vez, o custo social da inflação de alimentos coloca os mais pobres numa condição ainda mais desalentadora, com agravamento dos níveis de insegurança alimentar.

Por fim, entende-se que a inflação de alimentos é, predominantemente, um problema do lado da oferta, e não da demanda — razão pela qual a taxa de juros não possui a efetividade que comumente lhe é atribuída no controle dos preços desses produtos. É preciso que haja aumento da capacidade produtiva, portanto, crescimento da economia, para que as estruturas de oferta e de demanda possam se ajustar ao nível de preços relativos compatíveis com a dinâmica dos mercados de alimentos nos contextos interno e externo. A ampliação da oferta de alimentos deve ser sempre o caminho para redução das desigualdades econômicas e sociais, por meio da incorporação de um maior número de famílias no mercado de consumo alimentar, tanto nas regiões consideradas dinâmicas quanto naquelas em que parte da população ainda permanece na condição de pobreza absoluta.

*Professor Titular do Departamento de Economia da UFS.

[1] O IPCA, índice oficial da inflação, é calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), levando-se em conta uma cesta de itens, de acordo com o peso relativo definido a partir da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), e com base no estrato de 1 a 40 salários mínimos.

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