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O adeus a dois Josés

Marcos Cardoso*

Quis o destino que o arcebispo emérito Dom Luciano José Cabral Duarte e o ex-deputado federal José Carlos Teixeira morressem numa mesma tarde de outono. No dia 29 de maio de 2018, uma terça-feira, ambos se despediram da vida. Luciano José com 93 e José Carlos com 82 anos de idade.

Por caminhos diversos e até antagônicos, os dois Josés foram personagens imprescindíveis na construção da identidade cultural e política sergipana, e no momento mais grave da nossa história, que foi a ditadura militar de 1964 a 1985.

Uma coincidência já havia marcado de forma definitiva a biografia dos dois. O ano de 1966 foi decisivo para eles.

Naquele ano, o monsenhor Luciano Duarte foi sagrado bispo auxiliar de Aracaju, recebendo o báculo das mãos do arcebispo Dom José Vicente Távora, a quem viria suceder em 1971.

O professor e intelectual crescia na hierarquia da Igreja Católica, suas ações no campo social e educacional se fortaleciam, suas cultas pregações influenciavam gerações de cristãos.

Também naquele ano, o jovem deputado federal José Carlos Teixeira firmou-se como líder da resistência ao regime, organizando o Movimento Democrático Brasileiro, o MDB, que abrigava toda a oposição e os proscritos da esquerda, inclusive os comunistas.

Em 1966, o filho do empresário Oviêdo Teixeira reelegeu-se, sendo o único deputado federal pelo MDB, que também conseguiu eleger seis deputados estaduais, contra 26 da Arena, o partido do governo. A Assembleia Legislativa abrigava 32 parlamentares.

Dom Luciano foi mentor de um pioneiro projeto de reforma agrária no Estado. Com o apoio do governo local, a Arquidiocese adquiriu algumas fazendas em quatro municípios na bacia do rio Cotinguiba, onde ele implantou o Prohcase – Promoção do Homem do Campo de Sergipe, beneficiando centenas de famílias.

Além de criar paróquias, construir igrejas e capelas, ele fundou o Museu de Arte Sacra de São Cristóvão, que guarda um respeitável acervo histórico.

Mas certamente a sua obra mais importante foi a criação da Universidade Federal de Sergipe. Ele liderou a luta que culminou com a unificação numa mesma instituição das Escolas de Ciências Econômicas e de Química, da Faculdade de Direito, da Escola de Serviço Social, da Faculdade de Ciências Médicas e da Faculdade Católica de Filosofia, da qual foi o primeiro diretor.

Na noite do dia 15 de maio de 1968, no Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, Dom Luciano Duarte, já como presidente do Conselho Diretor da Universidade Federal de Sergipe, abriu a solenidade que instalava definitivamente a mais importante instituição sergipana de ensino superior.

No mesmo período, no recrudescimento da repressão, o deputado José Carlos Teixeira defendia a liberdade de universitários da mesma instituição, que lutavam contra o regime ditatorial.

Ele foi reeleito deputado federal em 1970 e mais uma vez em 1974, e foi prefeito nomeado de Aracaju em 1985, quando preparou a capital para a primeira eleição livre de prefeito, vencida pelo correligionário Jackson Barreto.

Em 1986, foi o único candidato a governador do PMDB a perder a eleição. Ele foi diretor da Caixa Econômica Federal e foi vice-governador na segunda gestão de João Alves Filho, de 1991 a 1994, de quem também foi secretário da Cultura em 2003.

Mas a obra mais marcante de José Carlos Teixeira na gestão cultural foi a Sociedade de Cultura Artística de Sergipe, a SCAS, que movimentou o ambiente artístico local nos anos 70 e 80, permitindo que o sergipano assistisse a grandes espetáculos nacionais e até internacionais.

Mesmo militando em campos ideologicamente opostos, Luciano Cabral Duarte e José Carlos Teixeira mantinham uma convivência respeitosa, alimentada à paixão pelas artes, pela música clássica, pela cultura.

*Marcos Cardoso é jornalista e escritor. Foi diretor de Redação do Jornal da Cidade, secretário de Comunicação da Prefeitura de Aracaju, diretor de Comunicação do Tribunal de Contas de Sergipe e é servidor de carreira da UFS. Dentre outros livros, é autor de “Sempre aos Domingos – Antologia de textos jornalísticos” e do romance “O Anofelino Solerte”.

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