Por Antônio Samarone *
A vida econômica está voltando a normalidade, mesmo com a Pandemia em expansão. O grande confinamento vai acabar. A principal pergunta é o que fazer.
Quais são as medidas da Saúde Pública para enfrentarmos a nova fase da Peste?
Até hoje a prevenção era feita por decretos. O poder público tentou normatizar a vida. Isso pode, aquilo não pode. Isso é essencial, aquilo não. Acompanhava os decretos alguns conselhos: usem máscaras, lavem as mãos, não se aglomerem e fiquem em casa.
Essa estratégia funcionou? Existem controvérsias.
Uma certeza: esse caminho sugerido pela OMS e adotado pelos estados e municípios foi melhor do que ter deixado que todos se contaminassem livremente, como pensa o governo federal. A chamada imunização de rebanho.
Essa conversa de alguns governadores que o isolamento social salvou tantas pessoas, e citam um número. É propaganda duvidosa. O isolamento foi o caminho possível, ajudou a rede assistencial a não entrar num colapso maior.
Mas isso está passando. A realidade é que todos voltaremos ao batente. O grande confinamento está acabando. Qual será a nova estratégia da Saúde Pública?
Os governos fizeram “planos” de retorno, com etapas, critérios, normas, achando que estão apontando um caminho seguro. O governador de Sergipe chegou a afirmar numa entrevista: “Já fizemos a nossa parte, publiquei decretos, comprei um lote de respiradores, agora é com vocês. A população precisa colaborar.”
Alto lá!
A doença não vai acabar com o final do confinamento. Pode até aumentar! Muita coisa sobre o comportamento desse novo coronavírus está sendo descoberto. Cada dia aparece uma novidade.
Quantos se contaminaram até agora, alguém sabe? Claro que não. A maioria das pessoas continuam susceptíveis. A OMS especula que 20% da população mundial já contraiu a doença. Mas esse dado pouco importa localmente.
Qual o índice de contaminados em cada município sergipano? Quantos já adquiriram imunidade, quantos continuam transmitindo? Até agora mal contabilizamos os doentes e os mortos. A realidade agora é outra.
Se não for iniciado um grande rastreamento, com busca ativa, testando todo mundo, com ampla parceria com a sociedade, a vida se tornará estranha e a convivência insuportável.
Sem um trabalho ativo de combate a praga, a vida não fluirá. Ninguém andará seguro. Esperar por uma vacina salvadora, é uma opção a médio prazo. A história não convida ao otimismo. Existem apenas 26 doenças vacináveis, de acordo com dados da OMS.
Levar uma vacina do laboratório para a rua, até agora, exigia uma média de mais de 10 anos. Isso quando é alcançado. Margaret Heckler, chefe de Saúde Pública do presidente dos EUA, Ronald Reagan, anunciou em 1984, que a vacina contra a Aids estaria pronta em dois anos. Mais de 35 anos já se passaram.
O grande confinamento pode se transformar no grande medo!
Sem informações, todos seremos suspeitos. Mesmo os que já adquiriram imunidade como portadores sãos, como não foram testados, não sabem, e continuarão assustados.
Só quem pode comandar uma nova estratégia da Saúde Pública é a rede básica do SUS. O caminho é muito parecido com as “Brigadas Emergenciais de Saúde”, sugerida pelo Comitê Científico do Nordeste.
Muda tudo! É preciso mobilizar muita gente. Quem foi esquecido até agora, vai precisar ser lembrado. O grande confinamento pode se transformar ou em uma grande mobilização ou em um grande medo.
Mesmo quando a Pandemia recuar, ela não vai embora. O vírus ficará endemicamente em nosso meio, causando surtos esporádicos. E mais, se não forem tomados os devidos cuidados, existe a possibilidade de uma segunda onda. Um segundo turno da Peste.
A Europa já está se preparando para enfrentar uma segunda onda, com a chegada do inverno. A vitória sobre a Peste em alguns países é parcial e efêmera. Nada a comemorar!
Uma alternativa sanitária razoável é a busca ativa dos remanescentes contaminados e que continuam transmitindo. Rastreá-los, testá-los, monitorá-los e isolá-los em rigorosa quarentena.
O trabalho da Saúde Pública está apenas começando.
A marca fundamental da nova estratégia é a participação popular. Sem parceria, sem envolvimento ativo da comunidade, nada feito. Quem vai garantir que os transmissores ficarão isolados em quarentena? Quem fará a vigilância de milhares de pessoas contaminadas se não houver a colaboração da sociedade?
Busca ativa, rastreamento, testagem, monitoramento e participação popular, essa é uma sugestão.
Sem informações, sem Inteligência, sem muito empenho dos trabalhadores da rede básica, sem o envolvimento de todos, não derrotaremos o grande mal tão cedo.
* É médico sanitarista e professor da Universidade Federal de Sergipe.