José Lima Santana*
A Universidade Federal de Sergipe, como qualquer instituição de ensino superior, notadamente as públicas, tem o dever de voltar-se para a produção do conhecimento. E, nesse mister, jamais esquecer que está situada num espaço geográfico, qual seja, o Estado de Sergipe. Dessa forma, tem também o dever de produzir ensino, extensão e pesquisa que possam atender aos interesses da sociedade sergipana.
Quando eu ingressei na UFS, como professor efetivo, em 1997 (no ano anterior, eu ingressara como substituto), tendo José Fernandes de Lima como reitor, no primeiro mandato presidencial de FHC, a situação financeira era precaríssima. Cheguei a ter que comprar o meu próprio “caixão de giz”. Os recursos repassados pelo MEC para o custeio eram sofríveis, insuficientes para as demandas. Aos poucos, contudo, a situação foi se ajeitando. Lima se reelegeu, vencendo desafios, imprimindo uma gestão muito proveitosa. Na sequência, o vice-reitor de Lima, Josué Modesto dos Passos Subrinho elegeu-se reitor e reelegeu-se. A UFS dava passos para a interiorização. A adesão ao REUNI foi contestada por alguns, mas a UFS avançou. Pode-se até discordar de certos casos pontuais, mas não se pode negar que em vários sentidos a UFS avançou muito.
Na sucessão de Josué, o seu vice-reitor Angelo Roberto Antoniolli elegeu-se reitor e reelegeu-se, como os dois reitores anteriores. A UFS continuou avançando, inclusive no interior com a instalação do Campus do Sertão. Obras importantes foram tocadas, iniciadas ou continuadas, somando recursos aplicados da ordem de R$ 270.914.801,28, em todos os Campi. Recursos do Orçamento da União e de emendas parlamentares.
A luta pela qualidade do ensino não foi desprezada. Hoje, são seis Campi (Aracaju, o da Saúde, São Cristóvão, a sede, Itabaiana, Laranjeiras, Lagarto e Sertão (provisoriamente, na cidade de Glória). Há quem diga que foi um erro a UFS ter-se lançado para o interior. Absurdo pensamento! A interiorização de qualquer instituição deve ser vista como salutar. Desconcentrar. É isso. Ir aos mais variados rincões do Estado. Muitas Universidades federais ou estaduais fizeram isso. Mais ainda, as Universidades particulares. Disso, temos exemplos aqui mesmo, no Estado. Bons exemplos.
Semanas atrás, setores da imprensa e das redes sociais tocaram na falta de recursos financeiros para a satisfação das necessidades da UFS. Enfim, de todas as congêneres federais. Algumas em situação mais grave do que outras. Tem-se dito e repetido que a educação não é prioridade de muitos governos e governantes. Não tem sido levada a sério com políticas de Estado, com diretrizes superiores que possam arrancar o país e o povo do atoleiro em que há décadas, ou desde sempre, meteram a educação, apesar de tantas reformas educacionais que o país viveu, do ensino de primeiras letras ao superior. E isso, basicamente, desde os tempos do Marquês de Pombal.
Após um breve período de sobressaltos, expectativas e ansiedades, inclusive com a nomeação de uma reitora pro tempore, no fim do ano passado, apesar de, na forma da legislação vigente, uma lista tríplice ter sido enviada ao Ministério da Educação, para a escolha por parte da Presidência da República, eis que o professor Valter Joviniano de Santana Filho assumiu a Reitoria em março último, colocado que fora em primeiro lugar na lista. Há enormes desafios a serem enfrentados. E há, ainda, alguma resistência residual em face do processo eleitoral que ensejou a elaboração da referida lista tríplice pelo Conselho Superior da UFS.
O atual reitor deve estar focado naquilo que é função sua, ou que seria de qualquer outro (a) professor (a) que estivesse em seu lugar. O momento é difícil para o ensino superior público federal. Vozes retrógradas, na maioria das vezes externas, cismam em meter o bedelho naquilo que nem sempre conhecem em profundidade. Ou mesmo no raso. Destilam doses de sarcasmo contra a Universidade pública e o ensino gratuito. Não enxergam – porque não lhes interessa – a diferença que existe, no geral, entre as instituições públicas de ensino superior e as idênticas do setor privado, especialmente na pesquisa. Basta que possam avaliar quaisquer modos de comparação publicados. Analisem parâmetros sérios, vindos de entidades avaliadoras públicas ou privadas. Há falhas? Há. Há erros a serem corrigidos? Bem sei. Mas, no geral, há muitos acertos.
Outra questão que tem sido levantada, em todo o país, é o que tange às ideologias políticas. Acho-as perniciosas, quaisquer que sejam. Cada grupo ideológico quer se abancar nas IES públicas. Isso é um mal, vindo de qualquer lado, mas muito maior é o mal que possa vir do ideário mítico, seja de qual agrupamento político-partidário for. Os governos não devem se apossar dos destinos da educação. O Estado, sim. O mal dos nossos governantes, de todos eles, é que ainda pensam que são o próprio Estado, introjetando a autoritária frase atribuída a Luís XIV: “L’État c’est moi”. Ninguém é o Estado. Ninguém. O Estado é a conjugação de todos.
Segundo publicação recente da FAPESE, a UFS é detentora de cerca de 87% dos programas de pós-graduação stricto sensu e de 88% dos alunos regularmente matriculados em Sergipe, estando, assim, na vanguarda da produção científica e tecnológica do nosso Estado. A UFS é responsável por cerca de 91,07% de toda produção científica sergipana, que consta com 7.974 artigos publicados e que podem ser acessados por meio da base Scopus, ao passo que o Estado todo publicou 8.755, entre 1996 e 2020. Entretanto, é preciso saber o quanto tais artigos têm servido mais de perto aos interesses da sociedade sergipana em todas as áreas do conhecimento e, também, o quanto servem à própria Ciência, no contexto geral. Isso é outra discussão que deve ser levada em conta.
O que devemos esperar, querer e, se for o caso, cobrar do atual reitor? Que faça a UFS continuar crescendo. Capacidade de gestão ele tem. Já deu provas disso, nas funções que, anteriormente, exerceu na própria UFS. Que os órgãos internos, de origem sindical, estejam atentos. Faz parte do jogo. Que cada docente, discente e técnico-administrativo também. O mesmo se diga com relação à própria sociedade sergipana. Resistências e oposição devem haver sempre em todos os lugares. É parte do processo democrático. O que não deveria ocorrer, em qualquer tempo ou lugar, era a oposição ressentida pelo seu próprio fracasso.
As estruturas internas dos órgãos públicos em geral (ministérios, secretarias etc.) e das entidades administrativas (autarquias, fundações, sociedades de economia mista e empresas públicas) precisam se voltar para cumprir os comandos dos princípios estatuídos no art. 37 da Constituição Federal (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência). Gastar menos, na forma legal, mas alcançando maiores e melhores resultados.
Enfim, que os atuais caminhos da UFS sejam bem percorridos. É o mínimo que devemos esperar.
* É professor do Departamento de Direito da UFS.