Por Gilvan Manoel *
A Usina Termelétrica Porto de Sergi- pe I, localizada na Barra dos Coquei- ros operou comercialmente por apenas cinco meses desde que ficou pronta, segundo revelou o jornal Valor Econômico com dados fornecidos pela empresa Celse (centrais Elétricas de Sergipe), que administra a UTE. Produziu energia apenas em março de 2020 e nos meses de setembro a dezembro. De acordo com o jornal Valor, a previsão é de que a usina volte a integrar o sistema e produzir energia em julho, em função do risco de apagão que o Brasil está passando.
A Celse disse ao Valor que a usina não está operando por não ter sido acionada por decisão do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). A empresa admitiu que o empreendimento teve que realizar manutenções em suas turbinas nesse período, mas que esses procedimentos não teriam impedido a produção de energia.
Movida a gás natural liquefeito (GNL) importado da África, a UTE tem uma potência de 1,5 gigawatt (GW), sendo capaz de atender 15% da demanda de energia do Nordeste, ou 16 milhões de pessoas, segundo o jornal paulista. Sua capacidade instalada poderia elevar em quase 10% o despacho térmico atual, que tem atingido cerca de 17 GW.
O Anuário Socioeconômico de Sergipe, edição 2019, já mostrava que o início de operação da termelétrica e a exploração de petróleo em águas pro fundas e gás, no entanto, pouco agregarão à estrutura produtiva do estado. A influência estadual sobre as decisões de suas unidades, por sua vez, é mínima. O anuário é uma publicação do Grupo de Pesquisa em Análise de Dados Econômicos, vinculado ao Departamento de Economia da Universidade Federal de Sergipe, elaborado pelos professores Luiz Rogério de Camargo e Wagner Nóbrega, do Departamento de Economia da UFS e o economista do IFS, Rodrigo Melo Gois. A publicação pode ser disponibilizada gratuitamente em www.cafecomdados.com
Durante a inauguração oficial da termelétrica em agosto de 2020 – ela começou a operar antes da cerimônia festiva – com a presença do presidente Jair Bolsonaro, o governador Belivaldo Chagas disse que “a gente tem o prazer de ver oficialmente essa termelétrica sendo entregue à população sergipana e brasileira. Temos a maior termoelétrica a gás da América Latina. Ter um empreendimento em terras sergipanas, onde foi investido em torno de R$ 6 bilhões, num momento tão importante para o Brasil, é engrandecedor, e faz com que a gente aumente a nossa autoestima”.
Na mesma semana em que o governo de Sergipe festejava a inauguração oficial da UTE, a Petrobras desligava os queimadores do Terminal Aquaviário de Aracaju (Tecarmo). Com isso, a Petrobras suspende completamente sua presença no estado.
Em primeiro de abril de 2020, a Petrobras já havia paralisado a produção nas plataformas de exploração de petróleo e gás natural em águas rasas no estado de Sergipe, desativou a sua sede em Aracaju e fechou o Tecarmo, terminal de processamento montado há mais de 40 anos na Atalaia que recebia todo o petróleo e gás extraído das plataformas, e era responsável pela distribuição de gás de cozinha para municípios de Sergipe, Alagoas e Pernambuco. Para evitar explosões na unidade do Tecarmo, foi realizado o processo de despressurização, até o desligamento total no último dia 12.
A produção de petróleo e gás natural em Sergipe já vinha diminuindo, depois de apresentar ligeiros aumentos nos anos de 2012 e 2014, intercalados por aumento significativo no ano de 2013. E a Petrobras manteve fielmente o plano de desinvestimento em Sergipe, que nem mesmo a descoberta de grandes campos de petróleo e gás em águas profundas, ainda em testes, garantem a sua permanência no estado.
Os autores do Anuário Socioeconômico de Sergipe ressaltam que a situação econômica do estado é grave e seus desdobramentos agudizam os problemas sociais. “Esse quadro não é uma fatalidade, antes resulta de escolhas feitas ao longo da história, ao se construírem estruturas econômicas frágeis, durante surtos de crescimento promovidos pelo Governo Federal e por ex-estatais do setor produtivo”, destacam.
E alertam: “Podemos escolher o caminho que nos levará ao arrasto futuro, econômico e social, causado pelo (provável) arrefecimento ou desativação de plantas resultantes dos investimentos da termoelétrica e da exploração de petróleo e gás, trocados hoje por benefícios passageiros, ou escolher planejar o uso de tais benefícios, através de uma Administração Pública repensada para atuar mais ativa, eficiente e eficazmente na economia, de forma a endogeneizar as forças de crescimento e evitar os problemas sociais decorrentes de sua exaustão futura”.
Se produzindo normalmente a termelétrica pouco agrega à estrutura produtiva do estado, imagine sem produzir energia. É mais um choque na economia de Sergipe.
* É editor do Jornal do Dia (Artigo publicado originalmente no Jornal do Dia)