Por Antônio Samarone *
Depois da arrastada missa do galo, íamos todos à feirinha de Natal. Nunca procurei saber por que a missa era do galo, só sei que era.
Eu ficava avexado para a missa acabar, doido para mostrar a roupa nova na feirinha.
Em Itabaiana o galo cantava cedo, a missa do Natal começava às 20 horas. Todo mundo com a cabeça na feirinha de Natal, onde se tinha de quase tudo.
Eu guardava dinheiro o ano inteiro, num cofre de barro, para gastar na feirinha. Quando apurava, uma merreca, não dava para quase nada.
A feirinha de Natal em Itabaiana ocorria na Praça de Santa Cruz, onde também funcionava o Cinema do Padre. Na noite de Natal, era exibido, em duas sessões: o “Nascimento, Vida Paixão e Morte de Jesus Cristo”. O cinema ficava lotado, com muita gente em pé nos corredores.
Estranho! Cristo nascia e morria na noite de Natal, pelo menos no cinema.
Na entrada da feirinha, tinha bancas de jogos de azar (baralho, pio, roleta, argolas para os meninos, e um jogo do preá). Lembro-me de verdadeiras cafuas, onde os tabaréus iam fazer uma fezinha, ou seja, serem roubados.
Depois que Jânio Quadros proibiu os jogos à dinheiro, se concorria a goiabadas peixe e sardinhas, tudo novidade. Jogava-se nas roletas para se ganhar goiabadas.
A goiabada era um doce fino para os pobres.
No centro da feirinha tinha um poste com 4 bocas de alto falantes, tocando boleros e mandando recados para os tabaréus. “Fulano oferece a sicrana, que está com saia vermelha e blusa branca, essa gravação.” “Não sei quem oferece a não sei quem, apaixonadamente…” e tome bolero! Silvinho, Altemar Dutra, Núbia Lafaiete e Nelson Gonçalves, eram os mais tocados.
A música que me lembra o Natal é “Essa Noite Eu queria que o Mundo Acabasse”, cantada por Waldick Soriano. O disco com “Jingle Bells” não tinha chegado em Itabaiana.
Tinha os brinquedos: barcas, trivolí, balanços e a onda. Não me lembro de rodas gigantes.
A feirinha de Natal era lotada de vendedores. Não se chamava “feirinha” por boniteza.
Eu, já adolescente, vi maçã pela primeira vez numa feirinha de Natal. Eram maçãs argentinas, que Carlos Alberto trazia de São Paulo. Fui atentado pelo cheiro e pela novidade. Fui perguntar o preço, uma fortuna. Fiz o balanço de quanto tinha no bolso, era a conta.
Deparei-me com um grande dilema: compro a maçã e fico quebrado o resto da festa, ou controlo o meu instinto? O tempo passando e eu rondando a carroça de maçãs argentinas. A boca cheia d’água.
A serpente atentou e eu comprei a maçã. Entendi por que Adão foi enganado. Uma grande decepção, não gostei! Não tinha gosto de nada. Passei um tempão sem voltar a comer maçã. O trauma persiste até hoje, não vejo graça em maçã.
Gosto mesmo é de manga espada, caju e jabuticaba chupada no pé.
No final da feirinha existia uns pés de eucaliptos, próximos ao Grupo Escolar Guilhermino Bezerra. Lá, se concentravam as cozinheiras, vendendo arroz com galinha, em barracas. Se comia em pé. Galinha de capoeira com arroz amigo, sempre foi a minha ceia de Natal predileta.
Adoro até hoje. Não me venham com peru da Sadia que apita. Não gosto!
Conheci Papai Noel quando vim morar em Aracaju. Se já existia, nunca me apresentaram.
* É médico sanitarista