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O Brasil é um país improvável?

Por Antonio Samarone *

Durante uma visita de Aldous Huxley a Gilberto Freire, em Pernambuco, os repórteres perguntaram ao escritor norte americano, autor do Admirável Mundo Novo, o que ele achava do Brasil. Ele foi sucinto: “Acho o Brasil um país improvável.”

Eu nunca entendi esse pessimismo, achava o contrário.

Concordava com Darcy Ribeiro, que o Brasil, mais cedo ou mais tarde, seria a nova Roma. Uma potência mundial. O original povo mestiço, multicultural e heterogêneo, será a grande diferença.

Tomei um café de final de tarde com um velho amigo, médico e conterrâneo. Uma personalidade repleta de boa fé. Já sabia que ele era bolsonarista.

Começamos com amenidades, como qualquer conversa.

Quando perguntei sobre o Conselho Federal de Medicina (CFM), tomei um susto. Percebi que a nossa discordância era profunda. Eu não compreendia o que ele falava nem ele o que eu falava. Um diálogo de surdos.

O critério da verdade passou a ser a crença de cada um. “Houve um rompimento da linguagem”, como diz Eliane Brum?

Acho que a eterna quarentena ajudou nesse rompimento.

Não foi uma simples discordância ideológica, do tipo, eu entendo o que você está dizendo, mas não concordo. Não! O referencial de mundo era estranho. Os critérios de verdade não eram mutuamente reconhecidos.

Entramos na Era da Pós Verdade? Os fatos perderam a objetividade e as crenças são anteriores aos fatos.

O que mudou foi a forma de apreensão da realidade. A cisão da linguagem é profunda. Os dois mundos não se reconhecem. Ele me via como um esquerdopata e eu a ele como um fascista. Era o fim do diálogo, com um grande amigo.

Nos despedimos de forma aparentemente urbana, mas pensando mutuamente: “ele não tem jeito!”

“Esse é o abismo do qual nos aproximamos. Estamos à beira de algo com a magnitude do rompimento da linguagem que une os humanos, para além das diferenças de língua: uma parcela da população global aderindo a uma realidade falsificada, mas que, pela adesão, passa a se tornar real.” Eliane Brum.

É o fim da linguagem comum?

Aldous Huxley enxergou precocemente, o que estar ficando evidente: O Brasil pode não dar certo.

* É médico sanitarista

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