Por Gilvan Manoel *
As emendas parlamentares se transformaram em verdadeiros instrumentos de barganha entre deputados e senadores junto a prefeitos, governadores, donos de ongs e representantes de entidades da sociedade civil. Hoje é comum ver um parlamentar comandando inaugurações de obras em suas bases eleitorais e/ou distribuindo equipamentos a entidades e órgãos comandados por aliados políticos.
O projeto de lei orçamentária de 2022, o ano eleitoral, reserva R$ 10,5 bilhões para emendas individuais e R$ 5,7 bilhões para as emendas de bancada estadual, totalizando R$ 16,2 bilhões em emendas com execução obrigatória. Metade das emendas individuais deve ser destinada a ações e serviços públicos de saúde. Ainda há emendas RP-9 – incluídas num suposto orçamento secreto e que são destinados a parlamentares da base aliada do presidente Bolsonaro, sem qualquer mecanismo de fiscalização, como constatou o Tribunal de Contas da União (TCU).
Cada parlamentar terá direito a apresentar emendas até R$ 17,6 milhões (podem ser até 25 emendas diferentes), que obrigatoriamente precisam ser cumpridas pelos órgãos do governo federal. Os parlamentares ainda podem apresentar 15 emendas de bancada, cujo valor total por estado ainda está sendo definido pela Comissão de Orçamento.
Até 2015, as emendas parlamentares eram executadas livremente pelo governo federal. Ou seja, os parlamentares as propunham, mas o governo definia se os recursos para as emendas seriam liberados e quando. Por isso, esse instrumento era uma forma de barganha entre Executivo e Legislativo: os recursos das emendas eram liberados pelo governo em momentos estratégicos, quando havia necessidade de grande apoio do Legislativo para aprovação de projetos.
As emendas parlamentares são tradicionalmente utilizadas para projetos que agraciam as bases eleitorais dos congressistas. Ficam de olho nas emendas principalmente os prefeitos, que dependem em parte desses recursos. Ou seja, assim como o governo possui uma vantagem em liberar as emendas para o Congresso, os parlamentares conseguem barganhar com políticos da esfera municipal. Deputados estaduais também têm o poder de emendar o orçamento estadual, o que garante poder semelhantes ao dos deputados federais e senadores, dentro de seus estados, só que em volume menor.
Além da questão da barganha entre deputados, senadores e respectivas bases eleitorais, existem também casos mais graves envolvendo o uso de emendas parlamentares. Não são raros os escândalos de corrupção ligados ao uso desses recursos. Há casos de deputados que supostamente cobravam propina sobre a liberação de emendas a determinados grupos empresariais.
O maior escândalo de corrupção envolvendo as emendas ao orçamento foi desvendado em 1993 e ficou conhecido como “Anões do Orçamento”, e era comandado pelo relator da comissão mista, o deputado João Alves, que foi escolhido para o cargo durante vários anos seguidos e apontado como o chefe da quadrilha. Seis parlamentares foram cassados, quatro investigados renunciaram e oito foram absolvidos.
A partir do governo Michel Temer (de maio de 2016 a dezembro de 2018), o então deputado federal André Moura (PSC) foi escolhido líder do governo na Câmara e, depois, líder do Congresso, e se transformou no maior captador de recursos para o governo e prefeituras do estado de Sergipe, independente de emendas, cooptando politicamente até tradicionais adversários políticos, como o prefeito de Aracaju, Edvaldo Nogueira (PDT). A influência era tanta, que em 2018 ele decidiu disputar uma das vagas para o Senado, mesmo tendo no páreo outros figurões. Perdeu, porque eleição majoritária é diferente.
Além da fortuna em emendas, os deputados federais também são privilegiados pelos diretórios nacionais de seus partidos na distribuição de recursos do fundo partidário para as campanhas eleitorais. O dinheiro chega aos estados já carimbados.
Em 2018, o único que deputado que disputou a reeleição e perdeu foi Adelson Barreto, hoje sem chances de ganhar mais nada. André e Valadares Filho (PSB) disputaram e perderam cargos majoritários. Fábio Mitidieri (PSD), Laércio Oliveira (PP), Fábio Reis (MDB), João Daniel (PT) e Bosco Costa (PR) foram reeleitos com folga.
Hoje em dia um deputado federal só não conquista a reeleição se desistir de participar do pleito, tentar outro cargo, ou deixar para trabalhar somente no ano eleitoral. (Com informações do site Site Politze/Bruno André Blume, e de Ritta Oliveira)
Entusiasmo com Pacheco
O governador Belivaldo Chagas voltou de Brasília entusiasmado com a filiação do senador Rodrigo Pacheco, presidente do Congresso, ao PSD. “Ele reúne todas as características e qualidades para se tornar um candidato do PSD à presidência da República em 2022”, entende.
O ex-deputado estadual Jorge Araújo, fundador do PSD em Sergipe, também festejou: “A filiação de Rodrigo Pacheco ao PSD, é uma nova opção com credibilidade para o futuro do Brasil”.
Gurgel e Bolsonaro
O ataque sistemático de Jair Bolsonaro e do ministro da Saúde Marcelo Queiroga aos defensores da ciência segue incessante. Desta vez, o alvo foi o médico sergipano Ricardo Gurgel, indicado para ser o novo coordenador do Programa Nacional de Imunizações (PNI) do Ministério da Saúde. Por seus posicionamentos sobre medidas de combate à pandemia, como a não recomendação de medicamentos do ‘kit covid’ para tratar a doença, Gurgel foi, no entanto, impedido de assumir o cargo.
A nomeação do médico saiu há 23 dias, chegou a ser publicada no Diário Oficial, com portaria assinada por Queiroga. Mas Gurgel jamais foi chamado para tomar posse. Ele só descobriu que havia caído em desgraça no governo Bolsonaro quando decidiu viajar pessoalmente de Sergipe, onde nasceu e vive, para Brasília, para tentar descobrir o que estava acontecendo.
Foi quando ouviu de um coordenador do ministério que não iria assumir o cargo. O médico pagou um preço por criticar o ‘kit covid’ e defender a vacinação de adolescentes, contrariando o ministro Queiroga.
Ricardo Gurgel é um cidadão respeitável, um profissional competente. O que intriga é saber a razão de ter aceitado o convite para um cargo no governo Bolsonaro, após mais de 600 mil mortes por covid-19.
Disparos em massa nas eleições
Por unanimidade, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu, na quinta-feira (28), pela improcedência e arquivamento de duas Ações de Investigação Judicial Eleitoral (Aije) que pediam a cassação dos diplomas e a consequente inelegibilidade por oito anos do presidente da República, Jair Bolsonaro, e do vice, Hamilton Mourão, por suposto abuso de poder econômico e uso indevido de meios de comunicação na campanha eleitoral de 2018. A acusação era de impulsionamento ilegal de mensagens em massa via WhatsApp durante a campanha, bem como uso fraudulento de nome e CPF de idosos para registrar chips de celular utilizados para garantir os disparos.
O ministro Alexandre de Moraes, que será o presidente do TSE nas próximas eleições, afirmou que a Justiça Eleitoral se preparou para casos semelhantes e esse julgamento deixa isso muito claro. “Nós já sabemos como são os mecanismos, nós já sabemos agora quais provas rápidas [podem ser obtidas], em quanto tempo e como devem ser obtidas e não vamos admitir que essas milícias digitais tentem novamente desestabilizar as eleições, as instituições democráticas a partir de financiamentos espúrios não declarados, a partir de interesses econômicos também não declarados e que estão também sendo investigados”, asseverou.
Segundo ele, “se houver repetição do que foi feito em 2018, o registro será cassado e as pessoas que assim fizerem irão para a cadeia por atentarem contra as eleições e a democracia no Brasil”.
Canal de Xingó, nova enganação
Na solenidade de apresentação do projeto Canal Xingó, na quarta-feira (27), em Propriá, o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, afirmou que o projeto executivo será entregue em novembro deste ano e, em dezembro, deverá ser feita a licitação para contratação da empresa que executará a obra da fase 1.
A previsão é de que a obra seja executada por meio da Codevasf e venha a atender os municípios de Paulo Afonso e Santa Brígida, na Bahia, e Canindé do São Francisco, Poço Redondo, Porto da Folha, Monte Alegre de Sergipe e Nossa Senhora da Glória, em Sergipe.
O canal terá 50 quilômetros, dos quais 2,5 quilômetros são em túnel. O custo total desse trecho é de R$ 607 milhões. Não há dinheiro para a execução total da obra. É mais uma enganação, com a conivência da classe política sergipana.
Como sabe disso, no mesmo dia o governador Belivaldo Chagas preferiu acompanhar, em Brasília, a cerimônia de filiação do presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (MG), ao PSD.
Os Valadares e Rogério
Na terça-feira (26), foi realizada em Brasília uma reunião entre o presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, e o senador Rogério Carvalho (PT), que deve disputar o governo de Sergipe. A reunião foi solicitada pelo ex-deputado Valadares Filho, presidente do diretório estadual do partido, que acompanhou a reunião juntamente com o seu pai, ex-senador Valadares.
Segundo o ex-senador, os temas foram a política nacional e a sucessão no estado de Sergipe. “Um grande passo para a consolidação da aliança PT/PSB”, previu. Valadares pai pode voltar a disputar a eleição para o Senado e o filho vaga para a Câmara Federal.
* É editor do Jornal do Dia (Artigo publicado originalmente no Jornal do Dia edição de final de semana)