Por Eduardo Marcelo Silva Rocha *
A realidade que imperava no Brasil (e em outras regiões do mundo em momentos próximos ou paralelos, no início do século passado) deu azo a uma espécie de criminoso oriundo de causas ligadas ao poder político/econômico que sempre punha o mais fraco em posição de perda. Alguns destes criminosos usaram essa causa como justificativa aos seus atos subsequentes, de forma indiscriminada. Hoje, vemos no Brasil uma série de diatribes e/ou crimes sendo fundamentados do mesmo modo dos bandidos sociais.
Lampião, o mais famoso, já possuía um histórico de intrigas e arruaças, quando seu pai, depois de ser expulso de suas moradas devido à atuação (também) de forças políticas, foi morto por uma volante alagoana em um interrogatório, apenas por ser seu genitor. Ainda nesse contexto, muitos sertanejos também tornaram-se cangaceiros por sofrerem vilipêndios morais e econômicos por parte de quem lhes detinha mais poder. A gênese do Banditismo Social parece ser isso: as causas que levaram aqueles homens a entrincheirarem no crime.
Muito distante das causas, que se explicam conforme o dito, está a transformação do crime, no caso do cangaço, em meio de vida, como o fez Lampião. Afinal, a causa de um fato serve, via de regra – como neste caso – para explicá-lo e não para justificá-lo. A função do entendimento deste fenômeno é fornecer subsídios para que se possa, combatendo a causa, evitar a proliferação deste desequilíbrio social e não lhe passar a “mão na cabeça”.
Pois bem, alguns cangaceiros – por exemplo – alegavam que estavam naquela vida de crimes há anos, por falta de opção e que isso não era culpa deles, sem maiores considerações. Ora, assim como a morte de um pai de um cangaceiro em um interrogatório não se pode justificar em nenhuma hipótese, também não pode esse tipo de alegação.
Mas em ambos os casos hão de dizer, que há uma explicação ético/moral – o chamado escudo ético, que nada mais é um subterfúgio para não se admitir que o proceder está não apenas contra às Leis, mas também às normas de convívio social.
Apesar de parecer algo adstrito ao período inicial do século passado, vemos hoje o mesmo caminho sendo trilhado diuturnamente. Nos últimos anos, normalizou-se a circulação de discursos contra grupos marginalizados (ou a tentativa de marginalizá-los), de violência contra quem pensa contrário, de defender o extermínio dos opositores políticos ideológicos e de ataques às instituições democráticas.
Como não pretendo ser raso como esses tais, é importante sabermos que as sociedades são compostas por todas as pessoas, que cada uma delas tem suas peculiaridades e que a organização da sociedade tem que ser pensada no todo. Lamento que portadores de diplomas em Ciências Jurídicas, que escreveram na prova de Direito Constitucional ser a igualdade algo de caráter adaptativo, hoje dizem que a igualdade é o que a maioria quiser, deixando claro que não aprendeu ou é questão moral mesmo.
Política é a arte de governar, democracia é a participação de todos – e todos os pensamentos – e a tripartição de poderes é essencial ao modelo democrático que temos.
Além disso, divergência de ideias só se resolve através da força fora da democracia e da república.
Assim, para justificar o autoritarismo em vigor, como pude testemunhar esses dias, o escudo ético usado por essa camarilha é acusar os que eles julgam ser inimigos, como quem age exatamente da forma que eles próprios, inclusive de violentos.
Meus queridos lamparinas, bem vindos ao banditismo político.
* É tenente coronel da PM/SE e membro da Academia Brasileira de Letras e Artes do cangaço (eduardomarcelosilvarocha@yahoo.com.br)