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Meus brinquedos

Por Antonio Samarone *

O primeiro brinquedo que guardei na lembrança, foi um apito de som anasalado, fanhoso e fino, que achei no banco da igreja. Um apito com ruídos irritantes e sem graça. Mesmo assim, eu me apeguei. Mamãe tinha medo de que eu engolisse, por isso jogou fora.

Nunca prestei a atenção à música. Não separava som de ruído. Nasci chorando alto, aos berros. Nunca soube nem assobiar direito. Não dei certo no coral da igreja, nem na filarmônica de Antonio Melo. Mesmo assim, o meu segundo brinquedo foi um realejo de taquara.

Depois colecionei boi de barro. Mamãe sempre trazia da feira. A minha coleção fazia inveja aos meninos bestas. Depois os bois começaram a quebrar as pernas e não ficavam mais em pé. Esse fato permitiu o meu primeiro insight de inteligência: quebrei as pernas restantes e me tornei um fazendeiro de bois cotós.

Carrinho eu não sabia fazer, nem de lata de sardinha. Ximava os carros de madeira do filho de Seu marinho. Pareciam carros de mesmo. Brincava também empurrando um roda de borracha com um arame adaptado. Não sei descrevê-lo, mas gostava muito.

Na brincadeira, já celebrei missas e fiz comícios com um funil de flandres. Meu pai me levava para os comícios de Manoel Teles, do Partido de Leite Neto.

Brinquei muito na rua: cantigas de roda (pobre de marré deci), de manja, pé em barra, cipó queimado, bola de maraite, furão, mãos ao alto (mões), esconder, cipó queimado, pau de sebo, quebra pote e pipa. Tudo era aproveitado e virava brinquedo.

O brincar de bola era o rei das brincadeiras. Jogar pelada com bola de meia, na rua, estropiando os dedos e ralando os joelhos. Se fosse uma modalidade olímpica, o Santos do Beco Novo seria medalha de ouro. Depois apareceram as bolas de borracha e de plástico (a bola Pelé). Sempre descalços.

A bola de couro nunca chegou para o meu bico.

O sonho de sair da pobreza através do futebol, ser um jogador profissional, foi uma decorrência das duas Copas (58 e 62), vencidas pelo Brasil. Todo menino se acha um craque.

Como todo menino pobre, eu sonhava com um velocípede. Entretanto, se existisse Papai Noel no Beco Novo, eu teria pedido uma bola de couro, número cinco. E não um velocípede. O primeiro menino de minha rua que ganhou uma bola de couro, foi Benjamin de Seu Bebé.

Por sorte, mamãe me botou na escola e exigiu a minha frequência. Mamãe nem batia, nem castigava, dava conselho. “Meu filho o certo é assim! Se você seguir o caminho errado, o mundo lhe ensina. Com uma diferença: eu lhe ensino com carinho e o mundo ensina na pancada.”

Precisei trabalhar cedo (aos 15 anos). Logo descobrir que a escola seria a minha salvação. E foi! Na verdade, eu brincava mais do que estudava. Só comecei a estudar para valer, para não ficar por baixo dos meninos que foram estudar em Aracaju. Pura competição.

Depois viciei em leituras. Virou um divertimento.

* É médico sanitarista

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