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Aspectos históricos da Guarda Nacional – A Milícia Cidadã

Por Eduardo Marcelo Silva Rocha *

Aspectos históricos da Guarda Nacional – A Milícia Cidadã. A nova proposta de criação (recriação?) da Guarda Nacional traz ao debate os desafios constantes da segurança pública em nosso país. Apesar de muito de sua motivação advir dos eventos gravíssimos do dia 8 de janeiro de 2023, há, por outro lado questões estruturais que “arrudeiam” historicamente os serviços de segurança pública em nosso país. A proposta aqui, hoje, é conversar sobre a Guarda Nacional. Enfocando o contexto do seu surgimento e, ao mesmo tempo, traçando um paralelo com agora, tomando cuidado com o anacronismo essencial.

A administração da força de segurança na província em meados do século XVII, compunha-se, conforme Caio Prado Jr., em 3 segmentos: as Tropas de Linha (1.ª Linha), as Milícias (2.ª Linha) e os Corpos de Ordenanças (3.ª Linha). Segundo ele, as primeiras equivaleriam ao atual Exército, as Milícias eram forças complementares (de cada Capitania) de apoio às de 1.ª Linha, sem uma razoável equivalência atual e as Ordenanças, que se limitavam aos territórios de suas sedes. Caio Prado ainda observa que as ordenanças, força menos profissional e mais limitada das três “se como força armada as ordenanças ocupam em nossa história um plano obscuro, noutro setor, aliás não previsto pelas leis que a criaram, elas têm uma função ímpar”.

As Ordenanças contribuíram significativamente para o funcionamento da administração e da ordem legal neste país imenso, com população dispersada e carente de funcionários administração provincial. Nesse sentido, coube a perspicácia do Marques de Lavradio, o administrador que entendeu a pertinência, importância e necessidade de organizar tais corpos nas populações coloniais, como meio de ajustar o funcionamento da administração, vez que essa população tendia reconhecer como autoridades apenas os governadores e magistrados.

É importante lembrar, que neste período o que chamamos de Exército regular hoje, era composto maciçamente de tropas portuguesas que, inclusive, mantinham suas designações do país de origem.

(Clique na imagem para ampliar)

O início do século XIX, turbulento com a fuga da família real, abertura dos portos, proclamação da independência e abdicação do imperador, configurou um ambiente de instabilidade constante. Se considerarmos que a característica do Estado é a titularizar a força, podemos imaginar a importância do seu emprego em dias tensos como aquele.

As atuais polícias consideram esse período como o da sua gênese. Para as polícias civis, a criação da Intendência Geral da Polícia da Corte é o seu marco inicial, em 5 de abril de 1808. Às Polícias Militares, a criação da Divisão Militar da Guarda Real de Polícia, em 13 de maio de 1809.

O fato de relevância maior aqui é a problemática no sistema (que hoje chamaríamos de segurança pública) herdado do período colonial e potencializado pelo período instável iniciado com a vinda da família real até a “maioridade” de Pedro II.

Notadamente, o sistema se reorganiza logo após a abdicação, quando em 18 de agosto de 1831 edita-se a Lei que cria a Guarda Nacional que substituiria as citadas milícias e Ordenanças. Além da instabilidade, e dentro dela, residia com o componente da disputa da oficialidade Portuguesa (quiçá estrangeira, pois, haviam oficiais de outras nações nas forças brasileiras) em conter o inexorável processo de nacionalização em curso, principalmente após a criação da Real Academia Militar, em 1810.

Ademais, se havia quem defendesse a volta de Pedro I por um lado, pelo outro, havia os defensores da instauração de uma República/Federação. Eram muitos ingredientes nessa sopa, fazendo-a “grossa” e sem um “sabor” específico. Em 1842, diversas unidades da Guarda Nacional apoiaram a Revolta dos Liberais, entrando em confronto com Exército em ocasiões, exemplo mais conhecido a batalha entre as forças do Barão de Caxias (exército) contra forças de Teófilo Otoni.

Não é surpresa que poucos anos após, em 1850, a Guarda Nacional é reorganizada a partir de nova legislação, passando sua subordinação ao ministério da justiça e aos presidentes de províncias, excluindo agora os juízes desta função.

Haveria destaque na atuação da Guarda Nacional na Campanha do Paraguai, quando destacou contingente significativo, quase metade do efetivo total empregado, com atenção às tropas de cavalaria, que superavam as do Exército, que forneceram 2 regimentos para 22 dos corpos de guarda. Ainda sofreria algumas alterações em 1892 e em 1918, sendo extinta pelo presidente Artur Bernardes.

Nesses períodos a Guarda Nacional alternou funções de defesa da Constituição, da Independência e integridade do Império, de serviços de retaguarda do exército e ações interessadas à defesa geral do país.

A Guarda terminou por ser assimilada pelo Exército em 1922 e dentre outros fatores que possam explicar o fato, o recrutamento obrigatório foi um duro golpe nesse sentido.

 Diante de tais fatos não podemos cair no anacronismo, ao comparar a Guarda Nacional de outrora com propostas que vicejam no mundo nos últimos anos e, em especial, no Brasil em 2016 e agora em 2023. São momentos diferentes.

Quem acompanha com alguma atenção a matriz histórica de nossa segurança pública não se surpreende com o lançamento de propostas de reorganização do sistema, uma vez que o momento em que deveria tê-lo feito, na Constituinte dos anos 1980, não se fez, mantendo o modelo determinado em fins dos anos 1960. Perdeu-se a oportunidade, por isso a discussão não cessa. Mas isso é assunto pra outra conversa.

* É tenente-coronel da Polícia Militar de Sergipe

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