Após quase duas décadas de espera, duas comunidades quilombolas de Sergipe receberam a titulação das terras que historicamente habitam. As comunidades Lagoa dos Campinhos e Serra da Guia, que aguardaram por 19 e 18 anos, respectivamente, pelo reconhecimento formal de seus direitos ao território, foram as primeiras a receber os títulos de terra este ano.
De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), a titulação das terras das comunidades quilombolas representa o reconhecimento e, ao mesmo tempo, a proteção da memória dos habitantes daqueles territórios, e, por isso, está intimamente relacionada à identidade daquelas pessoas e grupos e à valorização da cultura e do povo quilombola. Somadas, as comunidades de Serra da Guia, localizada em Poço Redondo, e Lagoa dos Campinhos, situada nos municípios de Telha e Amparo de São Francisco, concentram 306 famílias.
Lagoa dos Campinhos
Desde 2004, o MPF vinha atuando para assegurar à comunidade de Lagoa dos Campinhos a titularidade de suas terras. Em 2019, o órgão emitiu recomendação ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para que desse continuidade aos processos de titulação de dez territórios quilombolas em Sergipe, entre eles o de Lagoa dos Campinhos.
“A demora em regularizar os territórios quilombolas acarreta uma série de problemas para essas comunidades, como dificuldade de subsistência, falta de acesso a serviços públicos, insegurança jurídica decorrente de longas batalhas judiciais, em geral, oriundas da resistência de setores econômicos; violências e preconceitos”, ressaltou o órgão na recomendação.
Antes da recomendação, o MPF já havia promovido reuniões envolvendo a própria comunidade e o poder público para solucionar impasses sobre o processo de titulação do território, como a confecção de um cadastro de moradores que ocorreu sem a participação das lideranças locais, conflitos entre moradores e fazendeiros da região, além de uma ação contra o município para garantir a coleta de lixo e outra contra a Companhia de Saneamento de Sergipe (Deso) para assegurar o fornecimento de água à comunidade.
Serra da Guia
Em 2022, o MPF moveu ação contra a União e o Incra requerendo que fosse dado andamento ao processo de identificação e delimitação do território quilombola de Serra da Guia, iniciado em 2005. O processo de demarcação feito pelo Incra já havia avançado algumas etapas até então, mas, de acordo o MPF, encontrava-se injustificadamente parado aguardando a publicação do decreto presidencial de desapropriação.
Na ação, o MP Federal argumentou que o território quilombola, em razão de sua localização e atributos naturais, está sujeito a interesses de pessoas não quilombolas e de empreendimentos de exploração de seus recursos, o que poderia causar conflitos na comunidade e privar os seus habitantes históricos da livre fruição de suas terras e de benefícios concedidos pelo poder público, como o crédito rural.
“Se as terras já tivessem sido desapropriadas e o território já estivesse plenamente constituído, na posse dos quilombolas, a possibilidade desses conflitos seria evitada e a comunidade poderia viver e se desenvolver sem o risco de sofrer transtornos dessa natureza”, sustentou o MPF.
Fonte: Ascom/MPF