Por Antônio Samarone *
O temido colapso dos Serviços de Saúde chegou à Sergipe. Não se trata de uma metáfora, é um colapso mesmo. É o paciente grave, com sofrimento intenso, necessitar de uma assistência especializada e não encontrar.
Essa carência não se resolve de improviso. Chega, manda comprar mais 50 respiradores e abre-se mais leitos. Não é assim que funciona. Um respirador não é um eletrodoméstico que você compra na loja, leva para casa, liga na tomada e ele começa a funcionar. Não é como o liquidificador de nossas casas.
Um leito de UTI precisa de equipamentos e muita tecnologia, entretanto, se não tiver profissionais qualificados, esses equipamentos de nada servem. Não basta ligar na tomada, precisa de gente competente para operá-los.
A alma da assistência numa UTI é a sua equipe de saúde.
Sem um bom médico intensivista, enfermeiras especializadas, fisioterapeutas treinados, os melhores equipamentos do mundo são lixo. Uma arma não mão de quem não sabe atirar.
Leitos de UTI são equipes de profissionais treinados, com condições de trabalho adequadas, tecnologias e insumos disponíveis, e segurança. Sergipe teve tempo para montar essas esquipes, treiná-las, capacitá-las, e não o fez.
Empurraram com a barriga. Não se levou a sério. Enganaram ao Ministério Público.
Quantos desses leitos de UTI em Sergipe, montados a toque de caixa, estão em condições de funcionamento adequado? Os pacientes entram sozinhos, em estado grave, sem a presença da família, desprotegidos, não podem avaliar a qualidade do serviço que estão recebendo.
Como agravante, não existe uma regulação única.
A Secretaria da Saúde do Estado aponta para um lado a de Aracaju para outro. O município tem dificuldades em transferir um paciente grave de suas UPAs, para um leito de UTI estadual. Pacientes já morreram pelas dificuldades burocráticas.
A essa altura, ainda não existe um fluxo estabelecido para os pacientes com covid. E não foi por falta de reuniões. Posso parecer duro, mas falta uma gestão competente. O critério político nas escolhas dos gestores é um crime contra a saúde pública.
Um paciente grave procurando a rede de saúde, ainda sem diagnóstico, para onde encaminhá-lo? As UTIs não aceitam pacientes sem diagnóstico. Eles esperam onde? Nem o Nestor Piva, nem o Fernando Franco, nem o hospital da campanha possuem estruturas adequadas para assistir a esses pacientes graves.
As UPAs estão lotadas com pacientes graves. E mais, ontem um paciente grave ficou no Onésimo Pinto, uma unidade básica, até tarde da noite. Ninguém sabia para onde encaminhá-lo. Uma perversidade.
Não existir um fluxo estabelecido para os pacientes de covid beira a estupidez.
A desorganização levou que o hospital da campanha receba pacientes já testados positivamente com necessidade de internamento, junto com pacientes sintomáticos, mas sem o diagnóstico.
Qual é o problema?
O polêmico hospital da campanha foi construído por gente acostumada a montar espaços de festas. Fizeram um ambiente único, as salas de atendimento não possuem cobertura, respira-se o mesmo ar em todo o ambiente.
O que significa essa aberração?
Uma pessoa internada com sintomas parecidos com os da covid, mas seja outra doença respiratória, ela vai se contagiar no hospital. Ambiente respiratório único, com o ar condicionado ajudando a espalhar o vírus, o hospital da campanha se transformou numa central de transmissão da Pandemia.
O hospital da campanha virou um Lazareto, um depósito de doentes aguardando o seu destino. Juntou-se num mesmo ambiente pacientes covid positivo, pacientes suspeito da covid e pacientes de outras patologias, que pareçam covid. Em pouco tempo, todos serão pacientes da covid.
Enquanto eles batem cabeça, a morte continua com a sua foice afiada. Chegamos a 116 óbitos, 292 pacientes internados e 3.105 pessoas testadas positivas, em suas casas, esperando a misericórdia de Deus.
Já chegamos no pico da Pandemia em Sergipe (27/05)?
Ninguém sabe!
Os dados são insuficientes. As previsões são especulativas. Sem dados corretos os “modelos matemáticos” são abstrações efêmeras. Quantos são os contaminados em Sergipe? A testagem é muito baixa.
* É médico sanitarista e professor da Universidade Federal de Sergipe.