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As calamidades visíveis e as invisíveis

Por Josué Modesto dos Passos Subrinho*

Nas cidades sergipanas onde houve alternância no cargo de prefeito(a) tornou-se um lugar comum a exibição das mazelas deixadas pela gestão anterior. São exemplos a exposições de frotas de veículos oficiais sucateados e depenados, demonstrativos de contas públicas zeradas, de acúmulos de dívidas e de uso, alegadamente irregular, da parcela de recursos decorrentes da privatização dos serviços de água e  esgoto da DESO recebida pelas prefeituras no apagar das luzes da gestão. Implícitos nesses gestos há uma promessa para os eleitores e cidadãos que, sob nova direção, nova realidade será construída. Tomara!

Há, entretanto, resultados da gestão municipal igualmente calamitosos, que salvo engano, não receberam a devida indignação. Os indicadores de qualidade das redes municipais de educação comprometem o desenvolvimento presente e futuro das comunidades. Para não amplificar o circo de horrores, apresentaremos apenas os resultados dos poucos municípios que têm indicadores que dignificaram o uso dos recursos públicos. As fontes para acesso aos dados serão indicadas para uso dos interessados.

A alfabetização na idade certa (7 anos, com o estudante cursando o segundo ano do ensino fundamental) é o passo mais decisivo para uma trajetória escolar de sucesso. A autonomia obtida pelo domínio da leitura, da escrita e do raciocínio matemático tem um imenso poder preditor sobre o futuro da criança. Antecede o ciclo de alfabetização a Educação Infantil, com creche e pré-escola, decisiva especialmente para as crianças nascidas em situações de precariedade socioeconômica. Todas essas etapas, no setor público, estão sob a responsabilidade da administração municipal. Quando esta falha, o nosso presente e futuro como sociedade estão comprometidos.

Em 2016, foi realizada uma Avaliação Nacional de Alfabetização. Sergipe ficou em último lugar entre os estados brasileiros que alfabetizavam as crianças na idade certa. Em 2023 foi realizada uma nova avaliação, que produziu o Indicador Nacional Criança Alfabetizada. Não obstante os esforços do programa Alfabetizar Pra Valer, lançado pelo governo do estado, em 2019, mas implantado efetivamente a partir de 2021, em decorrência da pandemia da COVID 19, novamente Sergipe apresentou os piores resultados, com apenas 31% das crianças alfabetizadas. O Ceará, com 85% das crianças alfabetizadas, e fonte de inspiração do programa Alfabetizar Pra Valer, foi o único estado que superou a meta de ao menos 80% das crianças alfabetizadas na idade certa.[1]

Quadro 1

Sergipe. 2023
Indicador Criança Alfabetizada
Município Percentual crianças alfabetizadas Meta 2024 Meta 2028 Meta 2030
Itabaianinha 59,1 62,52 74,93 80
São Cristóvão 55,9 59,87 74,22 80
Pedra Mole 47,6 52,91 72,37 80
Siriri 47,1 52,43 72,24 80
Canhoba 45,5 51,04 71,87 80
Cumbe 44,1 48,89 71,56 80
Moita Bonita 43,2 49,05 71,33 80
Tomar do Geru 42,9 48,79 71,26 80
Japaratuba 42,1 48,16 71,09 80
Tobias Barreto 41,9 47,95 71,03 80

Fonte: https://www.gov.br/inep/pt-br/areas-de-atuacao/avaliacao-e-exames-educacionais/avaliacao-da-alfabetizacao/resultados. Consulta em 08.02.2025.

Os municípios sergipanos de Itabaianinha e São Cristóvão foram os únicos que atingiram ou superaram a média nacional de crianças alfabetizadas na idade certa, de 56%, em 2023. Exibimos a meta para o ano de 2028, para lembrar aos atuais prefeitos a distância em termos de resultados na alfabetização que eles enfrentarão até o final dos atuais mandatos. Itabaianinha terá que acrescentar, no mínimo 16 pontos percentuais e Tobias Barreto no mínimo 29 pontos percentuais. O município em pior situação terá que evoluir com 49 pontos percentuais até o final do atual mandato e ainda terá que fazer enorme esforço para atingir a meta em 2030.

Os anos iniciais do ensino fundamental é etapa de atuação prioritária dos municípios com participação concomitante da rede estadual. Em alguns estados a etapa foi completamente municipalizada. Em Sergipe, em 2023, 83,85% das matrículas no setor público estavam sob a responsabilidade dos municípios e o restante 16,15% com a rede estadual. Portanto, os municípios são decisivos para a educação pública de qualidade.[2]

Desde 2005, a cada dois anos, com a divulgação dos resultados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB), surgem comentários sobre a insuficiência dos nossos resultados expressos no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB). Este índice é muito simples e capta duas variáveis importantes para aferir a qualidade e eficiência de um sistema educacional. Em primeiro lugar, o nível de aprendizagem, aferido através de uma prova nacional de Língua Portuguesa e Matemática aplicada aos estudantes matriculados nos anos-séries que marcam a conclusão de uma etapa educacional. Em segundo lugar, a taxa de aprovação dos estudantes na etapa objeto da avaliação. A multiplicação dos dois fatores produz um número na escala de zero a dez que facilita a compreensão de todos.

Vejamos os resultados dos 16 municípios sergipanos que, em 2023, atingiram ou superaram a meta fixada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) para o ano de 2021. A dilatação do prazo foi um dos efeitos da Pandemia da COVID 19 sobre a educação brasileira.

Quadro 2

Sergipe. Redes Municipais que atingiram ou superaram a meta do IDEB

 Anos Iniciais do Ensino Fundamental

Anos os 2005 e 2023 e Meta 2021

Nome do Município IDEB
2005
IDEB
2023
Meta 2021
São Cristóvão 2,5 6,4 4,9
Itabaianinha 2,6 6,0 5,0
São Francisco 2,7 5,3 4,9
Tobias Barreto 2,5

 

5,3 5,1
Aracaju 2,9 5,2 5,2
Cedro de São João 5,2 4,9
Japaratuba 5,2 4,7
Ilha das Flores 2,5 5,1 4,7
Telha 5,1 5,0
Amparo do São Francisco 2,7 5,0 4,9
General Maynard 2,2 5,0 4,7
Canhoba 4,9 4,3
Tomar do Geru 2,4 4,9 4,8
Santana do São Francisco 2,1 4,7 4,3
Siriri 2,3 4,7 4,7
Aquidabã 1,0 4,0 3,8

Fonte: INEP. https://www.gov.br/inep/pt-br/areas-de-atuacao/pesquisas-estatisticas-e-indicadores/censo-escolar/resultados

Ao contrário do Indicador Criança Alfabetizada que fixou uma meta de 80% das crianças alfabetizadas na idade certa a ser atingida por todos os municípios brasileiros, em 2030, exigindo mais esforços dos municípios que partiram com os piores resultados, a meta do IDEB foi fixada, em 2007, tendo em vista as condições socioeconômicas e educacionais de cada município. Aracaju e Aquidabã tem em comum o alcance da meta, mas enquanto a de Aracaju foi fixada em 5,2, a de Aquidabã foi fixada em 3,8. Como aconteceu com o Indicador Criança Alfabetizada, São Cristóvão e Itabaianinha se destacaram pelo atingimento da meta.

A diversidade geoeconômica dos municípios que atingiram a meta é um destaque, desde a capital passando por municípios de pequeno território e pequena população. Mas o destaque é a pequena representatividade do conjunto no total dos municípios sergipanos, apenas 21% dos 75.

Quanto aos anos finais do ensino fundamental, o número de municípios sergipanos que atingiram a meta é ainda menor, conforme podemos ver no quadro seguinte.

Quadro 3

Sergipe. Redes Municipais que atingiram ou superaram a meta do IDEB

 Anos Finais do Ensino Fundamental

Anos os 2005 e 2023 e Meta 2021

Nome do município IDEB 2005 IDEB 2023 META 2021
Cedro de São João nd 5,4 4,6
Itabaianinha 2,6 4,9 4,7
Japoatã nd 4,3 4,3
São Miguel do Aleixo nd 4,3 3,8
General Maynard nd 4,1 3,3
Canhoba nd 3,8 3,4
Brejo Grande nd 3,6 3,3
Muribeça nd 3,3 3,3

Fonte: INEP. https://www.gov.br/inep/pt-br/areas-de-atuacao/pesquisas-estatisticas-e-indicadores/censo-escolar/resultados

Apenas 8 dos 75 municípios sergipanos alcançaram a meta do IDEB. Observe-se a constância do município de Itabaianinha e a ausência dos municípios mais populosos e com atividades econômicas mais destacadas. A situação dos demais pode ser conferida no site do INEP.

Em resumo. A situação de baixíssima aprendizagem dos estudantes na maior parte dos nossos municípios parece não comover nem os dirigentes políticos nem a opinião pública de uma maneira geral. Além da aprendizagem insuficiente temos outros problemas como altas taxas de reprovação escolar, de defasagem da idade dos estudantes em relação à série escolar que deveriam estar frequentando, de abandono da escola e, portanto, de não frequência de parte importante da população em idade de escolarização obrigatória. Essa situação compromete o futuro dessas pessoas e da sociedade como um todo e precisa ser enfrentada com urgência.

Os municípios que apresentam melhores resultados começaram a receber recursos adicionais, a partir de 2023, de uma parcela adicional do FUNDEB, transferida diretamente do Tesouro Nacional, denominada Valor Aluno Ano Resultado (VAAR) e, a partir de 2024, a parcela adicional do chamado ICMS Social. Se os novos gestores tivessem consciência da relevância da situação educacional para o futuro de suas comunidades estariam destacando outra possível negligência dos seus antecessores, não apenas as mais visíveis. Ainda há tempo para que eles se proponham e se comprometam com a mudança da educação dos respectivos municípios.

Que assim seja!

*Foi reitor da Universidade Federal de Sergipe e da Universidade Federal da Integração Latino-Americana e titular das secretarias de Estado da Fazenda e da Educação de Sergipe.

[1] Fonte: https://view.officeapps.live.com/op/view.aspx?src=https%3A%2F%2Fdownload.inep.gov.br%2Favaliacao_da_alfabetizacao%2Fresultados_e_metas_ufs.xlsx&wdOrigin=BROWSELINK. Consultado em 08.02.2025.

[2] INEP. Sinopse Estatística da Educação Básica. 2023. https://www.gov.br/inep/pt-br/areas-de-atuacao/pesquisas-estatisticas-e-indicadores/censo-escolar/resultados.

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2 Comments

  1. NICEA SOUZA DA PIEDADE disse:

    Estudo excelente! Parabéns Professor Josué!

  2. Terezinha Oliva disse:

    Que bela contribuição para os sergipanos conhecerem a situação da educação fundamental pública e cobrarem responsabilidade dos governantes municipais! Vamos divulgar para ver se provocamos algum efeito de estudo tão relevante. Parabéns, prof. Josué!

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