Por Antonio Samarone *
Parei na entrada da Gameleira para comprar cajus, e encontrei uma festiva roda de gente, lorotando e tomando uma caninha com caju. Dizem ser um tira-gosto divino.
Depois de 500 anos, eles continuam repetindo um ritual Tupinambá.
Além das palmeiras onde cantavam os sabiás, os portugueses encontraram no Brasil, os cajueiros. Os Tupinambás desciam para o litoral, nos tempos dos cajus. Era uma festa: os frutos serviam de alimento, o sumo de vinho e a castanha de pão.
Os índios faziam vinho de caju.
Na verdade, o fruto é a castanha. “O caju é o pedúnculo carnudo e sumarento que dá o vinho e o vinagre.” – Câmara Cascudo.
“Do sumo desta fruta faz o Gentio vinho, com que se embebeda, que é de bom cheiro e saboroso.” – Gabriel Soares de Souza (1587).
Nos batizados lá em casa, papai servia aos convidados vinhos de caju, jenipapo e jurubeba. Eu só conheci vinho de uva, depois de grande. Não sei se ainda esses vinhos nativos são produzidos em Sergipe.
Havia uma brincadeira selvagem, se esquentava a castanha e com o óleo fervendo se fazia tatuagens primitivas. Na verdade, causava-se uma queimadura. Ainda bem que esqueceram essa maluquice.
O Carrilho continua fornecendo castanha assada para o Brasil.
Se contavam os anos pelas safras de cajus. “Acaiú” significa o ano, para o indígena da raça Tupi. Eu estou completando 67 cajus.
“Se diz no Nordeste: tenho quarenta cajus, valendo quarenta anos.” – Câmara Cascudo.
Os cajuís são silvestres, menores e travosos. Excelentes para doces.
“A natureza dos cajus é fria. São medicinais para os doentes de febres e para quem tem fastio. Fazem bem ao estomago, e muitas pessoas lhe tomam o sumo pela manhã, em jejum, para a conservação do estomago. Fazem um bom bafo a quem os come pela manhã, e por mais que se coma deles, não fazem mal a nenhuma hora do dia. São de tal digestão que em dois credos se esmoem.” – Gabriel Soares de Souza (1587)
O caju (Anacardium occidentale) é natural do Nordeste do Brasil.
A presença em outros continentes é posterior a chegada dos portugueses por aqui. Garcia da Orta, não cita a existência dos cajus em seu clássico “Colóquios dos Simples e Drogas da Índia e Goa”, escrito em 1563. Não existiam por lá.
A safra de caju continua sendo um acontecimento da cultura popular, pelo menos nos Condados do Mosqueiro, Areia Branca, Gameleira, São José e Robalo.
Val dos Cajus faz sucesso com os turistas, vendendo o caju ainda nos galhos do cajueiro que ele carrega na cacunda, com uma boa dose de cachaça. A Semana passada ele foi entrevistado por uma jornalista de São Paulo. Uma cachaça com caju custa cinco contos.
* É médico sanitarista