Paulo Roberto Alves Teles*
14 de fevereiro de 2021, morreu o ex-presidente Carlos Saúl Menem que deixou como legado um misto de contradições, crises e questionamentos. Se por um lado, ele foi eleito como representante do Partido Justicialista, grupo político herdeiro do líder histórico Juan Domingo Perón e caracterizado por políticas econômicas voltadas para questões sociais, por outro Menem adotou práticas liberais, dentre elas, privatizações e a paridade da moeda argentina com o dólar.
Menem ampliou a participação argentina no comércio internacional e esteve atrelado à fundação do Mercosul, no entanto, sua política econômica estabeleceu entraves aos produtos brasileiros o que dificultou a abertura do mercado argentino e a sua integração de forma mais ampla ao bloco. Além disso, a paridade monetária estabelecida pelo seu ministro Domingo Felipe Cavallo, apesar de ter contido a hiperinflação anterior, foi a principal responsável nas crises econômicas de 2001 e 2002. Também é possível mencionar que as privatizações realizadas durante esse período foram feitas mediante pagamento de propina e resultaram na criação de grupos monopolizantes.
Não bastassem esses problemas, o governo Menem (1989-1999) se envolveu em sucessivos escândalos de corrupção e ainda foi acusado de encobrir provas que trariam respostas para o atentado cometido contra a Associação Israelita Mutual Argentina (AMIA) em 1994, responsável pela morte de 85 pessoas, e que continua ainda em aberto. A ascensão de Menem ao poder em 1989 representou a possibilidade de consolidação da democracia após a Ditadura Militar argentina (1976-1983), no entanto, diante dos escândalos assistidos ao longo do seu governo e das crises posteriores a ele, não apenas o governo, como as instituições democráticas foram questionadas por grupos radicais de direita.
Em sua política externa, assistiu-se a uma aproximação do governo argentino aos Estados Unidos através do Tratado de Não-proliferação Nuclear (1991) e a sua colaboração ao enviar forças militares para a coalisão norte-americana durante a Guerra do Golfo (1990-1991). Internamente, Menem ampliou a participação política de árabes no governo argentino. Além disso, o envolvimento ativo dos seus irmãos, Eduardo e Munir Menem, foi marcante durante a gestão do presidente, o que levantou críticas por parte da mídia argentina, especialmente após o atentado contra a AMIA.
Carlos Menem foi próximo do casal Kirchner assim como do atual presidente argentino Alberto Fernandez que atuou no governo como Superintende de Seguros. Personalista, Menem participou da privatização a estatal petrolífera YPF, que mais tarde foi reestatizada pela presidente Cristina Kirchner, com o apoio de Menem que atuou como senador. Os paradoxos e as contradições o acompanharam durante a sua vida política.
Silvina Walger, jornalista e socióloga e autora do livro Pizza com champagne, termo utilizado para definir os grupos sociais argentinos que ascenderam a classe média devido a política de abertura de mercado, afirmava que os pilares do governo Menem foram: o cinismo, a frivolidade e a transgressão. Os escândalos e as acusações de propinas no El Menemato, como ficou conhecido esse período, reforçam essas críticas. A Era Menem (1989-1999) foi marcada por problemas que ainda estão em aberto e estes são desafiadores para todos aqueles que ocuparem a Casa Rosada.
*Doutor pelo Programa de Pós-Graduação em História Comparada da UFRJ – pauloteles_aju@hotmail.com