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Delirantes, abúlicos, débeis, apoucados, lesos e autômatos

Por Antônio Samarone

O cérebro é mais amplo que o céu e mais fundo do que o mar. O cérebro é apenas o peso de Deus”, Emily Dickinson.

O II Congresso da Sociedade de Neurologia, Psiquiatria e Higiene Mental do Nordeste, ocorreu em Aracaju, entre os dias 20 e 25 de outubro de 1940.

Na sessão de abertura, na sede do IHGS, o Interventor Federal em Sergipe, Eronides de Carvalho, fez um emocionado pronunciamento, afirmando que quando estudante na Bahia, seu desejo era ser alienista.

Após a fala do Governador, o sociólogo Gilberto Freyre realizou uma conferência sobre o tema: “Sociologia, psicologia e Psiquiatria”.

Eronides de Carvalho que transformou uma cadeia pública no templo da Saúde Pública, o Palácio Serigy, também Inaugurou o Hospital Colônia Eronides de Carvalho para psicopatas, até então enclausurados em cadeias públicas.

A assistência psiquiátrica começou em Sergipe assentada em três pilares: Hospital Colônia, Consultório Neuropsiquiátrico e Escritório de Higiene Mental, seguindo a escola de Ulysses Pernambucano de Melo. Logo depois desandou.

O Primeiro Hospital Psiquiátrico de Sergipe, o Hospital Colônia Eronides de Carvalho, foi inaugurado em 21/10/1940.

Dr. Luis da Rocha Cerqueira, médico alagoano, veio a Sergipe por indicação do Dr. Ulisses Pernambucano de Melo, para organizar o funcionamento do nosso Sistema de Atenção a psicopatas.

Nesse período, Sergipe não possuía alienistas. O Dr. Garcia Moreno foi o primeiro sergipano a especializar-se em psiquiatria.

O Dr. Luis da Rocha Cerqueira permaneceu em Sergipe até 1943, indo depois se tornar um dos grandes da psiquiatria brasileira, autor de importante obra de Psiquiatria Social. Faleceu no Rio de janeiro, em 1984.

O Hospital Colônia Eronides Carvalho era um frenocômio pavilhonar e de regime misto. Visava o atendimento dos pacientes agudos e crônicos. A assistência consistia numa observação inicial dos pacientes, para classificá-los (delirantes, abúlicos, débeis, apoucados, lesos e autômatos).

O passo seguinte era o isolamento; a clinoterapia (repouso no leito); a balneoterapia (banhos mornos). A farmacoterapia, o uso da clorpromazina, teve início na década de 1950. A convulsoterapia cardiozólica, insulínica e elétrica; a ludoterapia e a ergoterapia (terapias ocupacionais), eram os recursos terapêuticos existentes.

Só o desenvolvimento posterior da farmacologia permitiu substituir -se as camisas de forças pelas “camisas químicas”.

A terapia ocupacional na Colônia Eronides de Carvalho eram os trabalhos na agricultura, jardinagem e doméstico. O trabalho dos indigentes era remunerado.

A medicina dominante entendia o Hospital como um espaço de reeducação mental, e por isso necessitava-se de um ambiente sereno e tranquilo. Portanto, qualquer agitação era punida imediatamente com a segregação em células individuais (tranca), que na maioria das vezes era apenas espaços punitivos da indisciplina.

A convulso-terapia, em sua forma mais conhecida, o eletrochoque, também se enquadrava no sistema punitivo.

O Consultório Neuropsiquiátrico e Escritório de Higiene Mental funcionavam no Centro de Saúde Serigy. O Dr. Luis Cerqueira, discípulo da Escola de Recife, já defendia em 1940, um trabalho social de prevenção da doença mental.

Em seu discurso durante o II Congresso de Neuropsiquiatria do Nordeste realizado em Aracaju, Cerqueira defendia um pensamento que depois viria constituir-se na base da chamada reforma psiquiátrica:

“Não são esses asilos prisões de muros altos, para que não se veja por fora o que vai por ali dentro, com enfermeiros que mais parecem carcereiros – o de que precisamos, mas de centros de higiene mental. Não tanto para os loucos, mas para os que estão prestes a ficarem loucos. Nada desse isolamento completo”.

O Decreto de 10 de janeiro de 1946, nomeou o Dr. Armando Domingues, alienista assistente da Colônia Eronides de Carvalho.

Recém chegado de um curso de especialização em Neurologia e Higiene Mental, realizado na Capital da República, o Dr. Domingues foi contratado para suprir a vaga deixada pelo Dr. Luis Cerqueira.

O Dr. Luis da Rocha Cerqueira (1911 – 1984) tornou-se depois protagonista da reforma psiquiátrica brasileira. O primeiro CAPS de São Paulo, o Itapeva, leva o seu nome.

Luis Cerqueira foi discípulo da Escola de Ulysses Pernambucano de Melo, do Hospício da Tamarineira, em Recife.

* É médico Sanitarista e professor da Universidade Federal de Sergipe.

 

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