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Discussão sobre o Quinto Constitucional

Por Aurélio Belém do Espírito Santo *

Dirijo-me à advocacia e à sociedade sergipanas para restabelecer a verdade dos fatos, não com narrativas oportunistas e falaciosas, mas com demonstração inequívoca do que defendo.

Como advogado, eleitor e ex-diretor da OAB/SE, movi a ação judicial de nº 0800602-16.2025.4.05.8500, que tramitou na 2ª Vara Federal, para impedir a aplicação de parte da recém-aprovada Resolução 17 do Conselho Seccional da Ordem, somente no ponto em que alterou o rito do processo eleitoral em curso para transformar a tradicional eleição direta e livre da advocacia em casuística eleição híbrida, com a invencionice de mais uma fase no processo eleitoral.

Com isso, criou-se uma peneira, um filtro para escolher a dedo apenas 12 candidatos para serem votados pela classe, excluindo, na largada, os demais inscritos do páreo eleitoral, mediante votação aberta do Conselho Seccional, que modificou o Regimento Interno da OAB/SE, que, desde 1995, previa eleições diretas.

Na prática, o presidente da OAB/SE ditou nova regra para o jogo, onde o fair play não tem espaço, trazendo insegurança e desconfiança. Com 29 inscritos, apenas 12 poderiam ser votados, eis que o Conselho, após sabatina, pretende descartar, arbitrariamente, 17 colegas legitimamente inscritos, que seriam cartas fora do baralho do presidente.

Seguindo os planos maquiavélicos do mandachuva, em 6 de abril a advocacia seria convocada para legitimar a degola dos indesejados e votar nas cartas marcadas pela gestão.

Embora o magistrado federal tenha julgado improcedente os pedidos da ação, o processo seguiu com interposição de recurso de apelação ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região, pois divirjo juridicamente do respeitável entendimento do juiz singular.

Paralelamente, ante o perigo da demora na tramitação do recurso, ajuizei no TRF da 5ª Região “Tutela Recursal Antecedente”, como instrumento processual cabível para evitar danos de difícil reparação, como a nomeação de desembargador em processo inconstitucional.

Em Recife, o pedido liminar foi deferido pelo experiente desembargador federal Vladimir Carvalho, que suspendeu o processo eleitoral até julgamento do recurso pela 4ª Turma do TRF, consagrando entendimento de que a escolha tem efetiva natureza jurídica eleitoral.

Não discuto aqui a sentença recorrida, o que está sendo feito na via recursal. No entanto, para além do debate jurídico que, dentre outros pontos, envolve a aplicação do artigo 16 da Constituição Federal – princípio da anualidade – às eleições do Quinto Constitucional, sobressai o combate ao evidente e lamentável retrocesso democrático.

Portanto, trago à discussão nesse artigo de opinião outro lado da moeda. Isto é, o aspecto político-institucional da modificação casuística da regra tradicional do processo eleitoral pelo Conselho Seccional anterior, no apagar das luzes de 2024, e o faço criticamente de maneira construtiva e transparente para provocar a reflexão de interessados.

A vaga de desembargador está oficialmente aberta desde 18 de setembro de 2024. Para adequada leitura do cenário, destaco que a gestão passada da OAB/SE – comandada pelo presidente atual, Danniel Costa – teve três anos para implementar emendas regimentais para sua agenda antidemocrática.

Porém, estrategicamente, optou por fazê-lo após a eleição da OAB/SE, em 19 de novembro de 2024, quando o presidente fora reeleito, para evitar desgaste eleitoral com a classe, que poderia custar a sua não recondução ao cargo.

Com esse propósito oligárquico, a OAB/SE copiou resolução da OAB/BA, mas, diferentemente da vizinha, efetivou a mudança normativa um mês antes de lançar o edital das eleições, enquanto a seccional baiana o fez sem vaga aberta, ou seja, lá se alterou o sistema de votação para posteridade, sem casuísmo e com respeito à anualidade.

Embora os conselhos seccionais possam definir a forma de votação do Quinto Constitucional, as alterações da regra do processo eleitoral devem respeitar o princípio da anualidade, só podem valer um ano depois de sua aprovação.

A aplicação da anualidade é tese jurídica reconhecida em precedente da Justiça Federal, vide mandado de segurança nº 2007.85.00.005647-8, cuja decisão liminar concedida pela juíza federal Lidiane Vieira Bomfim Pinheiro de Meneses fora confirmada por sentença da juíza federal Telma Maria Santos.

Ademais, além do Regulamento Geral da OAB – artigo 137-C -, a própria Resolução 17/2024 – artigo 33 – invoca a aplicação da legislação e jurisprudência eleitorais. Ora, se há campanha e voto, o processo de escolha é eleitoral.

De forma inédita e autoritária, o presidente impôs modelo de eleição que usurpou da advocacia o direito do voto livre nos colegas inscritos, bem como sonegou destes o direito de serem votados pela classe, pois nos termos da resolução a advocacia só poderia votar em candidatos permitidos pela gestão, o que representa inegável retrocesso eleitoral.

Tamanho casuísmo, camuflado por retórica paternalista, considera tola a classe que representa, quando defende que a advocacia precisa de guia ou tutor que lhe indique os itinerários possíveis, sem os quais a classe, “ingênua e indefesa”, se perderia, vítima de abusos de candidatos.

Esse tratamento indigno denota a arrogância da velha política, incompatível com o discurso da campanha institucional, pois subestima a classe, julgando-a incapaz de escolher seus pares.

Não tenho satisfação em processar a OAB. Nunca o fiz. Ao contrário, sempre estive na defesa da instituição, enquanto diretor e advogado. No entanto, ajuizei a demanda em defesa da história da Ordem. Por não ser mais dirigente, bati à porta da Justiça Federal para recolocar a OAB nos trilhos democráticos e nos campos atinentes aos princípios da legalidade, interesse público, finalidade, motivação, segurança jurídica, impessoalidade e moralidade administrativa.

Nesse contexto, ressalto que a ação judicial é impessoal e eminentemente jurídica. Não trata de pessoas e sim do direito. Não busca favorecer ou prejudicar alguém. Não defende interesse pessoal, mas sim coletivo.

Pretende, sobretudo, a regularidade e a lisura da eleição, afastando a sombra da desconfiança para que o pleito paire olimpicamente acima de qualquer suspeita, em respeito aos princípios da normalidade e legitimidade eleitorais.

A OAB/SE sempre foi farol a iluminar caminhos democráticos e não pode estar exposta como alvo de especulações de estratagemas que depõem contra sua história. A situação lembra passagem da história romana em que Júlio César, proclamou a frase “À mulher de César não basta ser honesta, deve parecer honesta”. O episódio serve para reflexão, pois a eleição do Quinto Constitucional deve ser e parecer honesta.

Aliás, enquanto a resolução é excludente por arquitetar fase eliminatória de candidatos, a ação judicial é inclusiva, pois tem o objetivo de incluir todos os inscritos na votação direta da classe, sem eliminações prévias, garantindo-se a paridade de gênero e a representatividade racial na formação da lista sêxtupla, conforme consta, expressamente, na ação judicial.

A tentativa maliciosa de desvirtuar o foco da discussão, com disseminação de desinformação e notícia falsa acerca dos objetivos tão claros e inequívocos da ação judicial, reflete mais um desrespeito à advocacia sergipana, que é tratada com desdém, pois escancara intenção pouco nobre da gestão do presidente no debate de questão de suma importância. A verdade está estampada no corpo da petição inicial do processo, que pode ser lida por quem desejar.

A garantia da paridade de gênero e da representatividade racial pode e deve ser feita na lista sêxtupla pelo Conselho Seccional, após a votação livre e direta da classe. Para tanto, não é preciso criar filtro de candidaturas para escolher a dedo, por exemplo, qual a mulher preta poderá concorrer, até porque, mesmo com a peneira prévia, a paridade e representatividade teriam que ser mantidas na lista sêxtupla. Ou será que a atual gestão não iria fazê-lo?

A prosperar a ação judicial, a democracia estará salvaguardada, dispensando as candidaturas negras e femininas do constrangimento de terem que ser “amigas do rei” para integrar a lista duodécima. Ou seja, às tais candidaturas bastará serem amigas da classe para conquistar o voto direto e livre da advocacia, como se espera em qualquer eleição séria. Em síntese, a ideia é simples, os mais votados pela classe integrarão a lista sêxtupla, assegurando os espaços devidos às mulheres e à advocacia negra.

A propósito, frise-se que a ação judicial combate parcialmente a aplicação da nova resolução ao processo eleitoral apenas e tão somente no que diz respeito a criação da fase eliminatória prévia, no entanto mantém a aplicação imediata das políticas afirmativas de inclusão de minorias historicamente marginalizadas quando da formação da lista sêxtupla, conforme decidiu o STF.

A operação jurídica é simples, decota-se da resolução aquilo que exclui e mantem o que inclui, somente assim teremos acesso livre à disputa, encorajando colegas a participar sem a preocupação desanimadora de pagar caro para colocar o pescoço na guilhotina.

Quanto ao atraso no processo eleitoral, justificado pela necessidade de análise da manifesta inconstitucionalidade, a solução está nas mãos do presidente da OAB/SE, que pode tudo resolver, desde que abandone o orgulho vaidoso e egocentrista para assumir postura coletiva e democrática, aproveitando o freio de arrumação da liminar suspensiva para cancelar o edital excludente e lançar um novo sem filtros prévios, respeitando a anualidade eleitoral, a paridade de gênero e a representatividade racial na formação da lista sêxtupla pela votação direta e livre da advocacia. Eu seria o primeiro a aplaudir!

Contudo, o que chama a atenção é a intransigência na manutenção a qualquer custo do novo modelo antidemocrático. Independentemente do desfecho judicial, o ponto insofismável – que salta aos olhos, grita aos ouvidos, arrepia a pele, torce o nariz e desgosta a boca – é que a gestão da Ordem interveio no voto livre da advocacia sergipana.

Contudo, a advocacia sergipana é sagaz e tem senso crítico, nunca teve vocação para massa de manobra, sabe seus direitos e também sabe votar. A prova disso é que escolheu muito bem seus representantes nos três últimos pleitos para o Quinto Constitucional, quando, acertadamente, incluiu, pelo voto direto e livre, grandes desembargadores, sendo dois para o TJSE, Roberto Eugênio da Fonseca Porto e Edson Ulisses de Melo, e outro para o Tribunal Regional do Trabalho, Thenisson Santana Dórea, que honram e dignificam o cargo que ocupam.

(Artigo publicado originalmente no site LJPolítica)

* É advogado.

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