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Dr. Helvécio Ferreira de Andrade, o 1º homeopata em Sergipe

Por Antonio Samarone *

Helvécio Ferreira de Andrade nasceu em 06 de maio de 1864, no sítio Chapada do Engenho Boa Sorte, Capela/SE. Faleceu aos 76 anos, em Aracaju, em 19 de agosto de 1940.

Formou-se inicialmente em Farmácia e logo depois recebeu o grau de doutor em Medicina, pela Faculdade de Medicina da Bahia, em 1886. Defendeu tese sobre a tuberculose. Foi colega de turma de Theodoreto Archanjo do Nascimento, outro sergipano ilustre.

Depois de formado, exerceu a medicina em Própria, entre os anos de 1887 a 1900. Emigrou para São Paulo, como era comum entre os médicos sergipanos, indo residir na cidade de Santos. Em seu exílio, atuou como médico da Santa Casa de Misericórdia. Exerceu também os cargos de Inspetor Sanitário e de Inspetor Geral do Ensino Público, em Santos.

Em sua passagem por Santos publicou os seguintes trabalhos: “Epidemia de Febre Amarela” – Santos, 1892; “Tuberculose, estudos das causas de sua frequência” – Tipografia Brasil -Santos, 1894; Leituras Médicas: o que é Homeopatia”, Tipografia Brasil -Santos, 1899; História da Peste Bubônica em Santos.

Nesse período, Helvécio Andrade publicou o primeiro trabalho sobre a história da medicina em Sergipe: “Climatologia e Geografia Médica do Estado de Sergipe” – 1906; trabalho apresentado no 4º Congresso Médico Latino-americano.

Retornou à Sergipe. Entre 1900 e 1910 exerceu a medicina na cidade de Maruim. A partir de 1910, já experiente e com grande bagagem cultural, foi nomeado para o cargo de Delegado Fiscal do Governo Federal, junto ao Atheneu Sergipense, passando a residir em Aracaju.

Exerceu uma grande influência intelectual em Aracaju. Publicou o primeiro Jornal de Medicina em Sergipe, em 1911, e participou da fundação de uma primeira Sociedade Médica em Sergipe. Foi um polemista na imprensa, sempre em defesa da homeopatia.

Exerceu a homeopatia desde o final do século XIX.

No anúncio do “Consultório e Laboratório Homeopático” de Helvécio de Andrade, localizado à rua São Cristóvão nº 7, constava as seguintes informações:

“Dispõe de completa ambulância, para uso clínico, de medicamentos em tinturas, diluições e triturações, segundo a posologia da Terapêutica Positiva”. “Medicamentos homeopáticos absolutamente puros em tinturas, dinamizações e triturações, preparado com material recebido dos principais laboratórios do Rio de Janeiro”.

“Nossas dinamizações, sendo todas ao décimo, garantem os mais prontos resultados no tratamento das moléstias agudas”.

O Doutor Helvécio de Andrade começou a empregar o Arseno-benzol (606) no tratamento da sífilis, homeopaticamente, em injeções hipodérmicas. Fez o mesmo com o ”Tuberculinum“no tratamento da tuberculose pulmonar.

No mesmo período, o Doutor Berílio Leite anunciava o uso dos mesmos medicamentos, para as mesmas doenças, só que usando alopaticamente.

O 606 (Salvarsan) era um medicamento famoso no Mundo no tratamento da sífilis, em substituição aos tratamentos mercuriais. O Salvarsan foi descoberto pelo médico alemão Paul Ehrlich, grande precursor da quimioterapia.

Depois se provou que a eficácia do 606 era muito reduzida ou quase nula. Entretanto, apresentava a vantagem de possuir efeitos colaterais reduzidos.

A grande polêmica:

O falecimento do Jovem Everton Coelho em 12 de abril de 1918, filho de um rico comerciante, membro da loja maçônica Cotinguiba, foi um escândalo em Aracaju.

A família de Everton procurou o Doutor Helvécio de Andrade, que diagnosticou o rapaz como portador de sífilis, complicada com nefrite, onde a primeira providência seria a suspensão do medicamento à base de mercúrio que vinha recebendo.

O problema é que o medicamento tinha sido prescrito pelo famoso Dr. Augusto Leite.

O paciente morreu e a família se convenceu de que foi efeito do uso inadequado do medicamento, colocando no túmulo um verso de Camões: “Mas debaixo o veneno vem coberto, segundo foi o engano descoberto, oh! Caso grande, estranho e não cuidado”.

Dr. Augusto Leite reagiu, sentiu-se vítima de denuncia infundada, por parte de Helvécio Andrade.

Augusto Leite enviou uma carta para todos os médicos de Sergipe, com a seguinte pergunta: “Afirma você que o cianeto de mercúrio por mim administrado em 12 injeções, tenha sido a causa determinante da crise e do óbito?”

Todos responderam negativamente, mesmo assim, o Dr. Augusto deu ampla divulgação na imprensa. Só Antonio Militão de Bragança se absteve.

O Dr. Augusto Leite, não satisfeito, convocou uma Conferência Pública para o dia 14 de julho de 1919, às sete horas da noite, na Biblioteca Pública, onde ele apresentaria o caso clínico para todos os interessados, especialmente para a classe médica, que serviria de tribunal para o julgamento do caso. O Dr. Augusto cobrava a presença do facultativo acusador e da família do morto.

“Quero ser julgado pelos médicos e pelo povo desta infelicíssima Terra, onde se forjam em bronze e se perpetuam as mais feias injúrias” – Dizia Augusto Leite.

O caso foi parar na justiça. A Sociedade de Medicina e Cirurgia de Sergipe, por unanimidade, deu apoio ao Dr. Augusto Leite.

O Dr. Augusto Leite foi absolvido pelos colegas, mesmo assim, sentiu-se ofendido, e foi exercer a sua clinica em Recife, por uns tempos.

O que a medicina já sabia naquele tempo sobre o cianeto de mercúrio?

O mercúrio era empregado na medicina desde a antiguidade, mas já estava sendo substituído por outros medicamentos mais potentes e menos tóxicos.

O cianeto de mercúrio Hg (CN)2 utilizado pelo Dr. Augusto Leite no paciente que faleceu, já estava em desuso. Helvécio de Andrade acertou em orientar a suspensão.

Cianeto ou cianureto é o nome de qualquer composto químico que contém o grupo ciano C≡N, com uma ligação tríplice entre o átomo de carbono e o de nitrogênio. Por sua vez, o mercúrio, uma vez absolvido e passando ao sangue, é oxidado e forma compostos solúveis, os quais se combinam com as proteínas sais e álcalis dos tecidos.

Os mercuriais interferem no metabolismo e função celular pela sua capacidade de inativar as sulfidrilas das enzimas, deprimindo o mecanismo enzimático celular.

Isso não significa que a causa do óbito de Everton Coelho tenha sido as injeções de cianeto de mercúrio prescritas por Augusto Leite. O caso não foi investigado. Entretanto, Helvécio de Andrade não acusou Augusto Leite. Apenas aconselhou a família que suspendesse o medicamento em uso.

A inscrição no túmulo de Everton no Cemitério Santa Isabel, já foi apagada. O episódio não reduziu a importância de Augusto Leite para a consolidação da medicina em Sergipe. O Hospital de Cirurgia, obra dele, foi o berço da medicina científica.

O conselho do homeopata Helvécio de Andrade foi sensato. O salvarsan (606) existia desde 1911. Mesmo assim, Helvécio de Andrade, nunca foi perdoado pela elite médica sergipana.

Por outro lado, Helvécio de Andrade é festejado pelo seu trabalho na Educação em Sergipe.

* É médico sanitarista

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