Por Neu Fontes *
Participei de uma festa em 2018 protagonizada por garotos e garotas de pouco mais de 20 anos. E eu, com meus 58 anos e 42 festivais nas costas, adorei participar. O primeiro, ninguém esquece, foi em 1978, no colégio Salesiano, onde tive a minha primeira participação, com duas músicas, “Vida no Refrão” e “Liberdade 5”, em parceria com Alexi Pinheiro e Nestor Piva. Ganhamos o primeiro e o segundo lugares do Festival. E dali por diante foram dezenas de participações pelo Brasil.
Considerava os festivais como uma “festabatalha”, a festa do encontro, da alegria, do aprendizado, da luz e da energia. A batalha desenrolava-se em duas frentes, no palco e nos bastidores.
No palco, as músicas apresentadas, suas letras, mensagens, performance e, o principal, o entendimento, o gosto do público, que transformado em torcida acirra a competição. Nos bastidores, a batalha sempre foi para dar tudo certo, som perfeito, microfone no lugar, músicos afinados, som sem microfonia e felicidade na diversão.
Claro que tem os mais estressados. E aí ficava mais divertido ainda, pois o nervosismo rolava e a atenção dobra. Quem tinha mais calma, se dava bem, pois a única função do artista era levar sua música, sua mensagem, da melhor maneira possível, para o público.
Esse era o grande significado. Nota, colocação, classificação, troféu, ficavam por conta de quem foi convidado a entrar nessa enrascada de escolher o melhor. O melhor não existia. Todos tinham a mesma função de levar música para as pessoas. E por certo, sempre terá alguém que se identifique com a mensagem, a melodia, a voz, o sentimento e a energia. A música irá alcançar alguém.
Paulo Machado de Carvalho, o criador da TV Record e um dos maiores incentivadores dos Festivais nas décadas de 60, comentou uma vez: “Eu comparo a concepção do festival à dos programas de luta livre. Tinha que ter o mocinho, o bandido, a heroína”.
Naquela época, os festivais brigavam por audiência, as emissoras e gravadoras existentes, queriam vender seus produtos. Hoje, somos todos heróis e mocinhos. Heróis como o Sesc/Senac que produz o festival em tempos de tanta escassez de recursos para a Cultura. E mocinhos que sobem ao palco levando a coragem e a certeza que podem contribuir para uma reflexão ou diversão das pessoas, com suas músicas e mensagens, das mais complexas às mais simples.
O Sesc está de parabéns. Deu-me a possibilidade de subir mais uma vez ao palco, cantando minhas músicas e deixando-me sentir de novo uma felicidade imensa. Revivi todos os 41 festivais que participei, os seis discos que gravei e as centenas de shows que realizei durante minha vida artística.
Pude constatar, in loco, artistas com muito potencial. E destaco aqui, sem medo de errar, que estradas estão sendo construídas, como a de Julico do “The Baggios”. são infinitas. O menino sabe fazer som. Como uma guitarra, um baixo e uma voz que podem sonorizar e harmonizar melodias tão bacanas em um ginásio tão ruim de acústica? Julico pode.
Assistimos Pedro Luan, “filho de peixe tubarão é”. O garoto orgulha-me demais! Imagino o Pai, o grande e saudoso Rogério. Com certeza está muito feliz. O garoto, com seus 19 anos, é hoje um dos grandes artistas sergipanos com futuro nacional. Pedro Luan é cantor, músico, compositor e tem um caráter ímpar.
Donali, que à na frente a bela e excelente cantora Fernanda. A moça já é de uma família musical. Eu a vi nascer musicalmente no meu estúdio, Capitania do Som. Ela foi levada por Emanuel Jorge para gravar vocais, em sua primeira produção musical. Fernanda é afinada, tem uma bela dicção, um senso de palco impressionante e músicos excelentes. Futuro garantido. Jeca, conheci fazendo teatro com Jorge Lins e não imaginava ter tanto potencial. Grande intérprete, performática, agrada muito a quem está assistindo, além de fazer uma música com significados da Cultura Popular.
Larissa Abreu e Mileide Silva, duas das novas cantoras gospel, têm estilos diferentes, mas com grande potencial vocal. E a Banda Brasa Viva, de Forró Gospel, uma novidade na música sergipana, mistura a nossatradição forrozeiras, com exaltação a Jesus e à vida. A Festa do Sescanção foi bonita, desde a sua eliminatória. Bem-organizada e produzida pela equipe do Sesc, com sonorização de Ricardo Sá e sua equipe de profissionais. Grandes Amigos, de muitos palcos. Iluminação de Daniel e produção técnica de Negão.
A solicitação é que seja realizado todos os anos, pois possibilita o aumento da produção musical sergipana e a revelação de mais talentos da nossa música. Todo sistema “S” presta um grande serviço à cultura brasileira. O Sesc, em especial, vai do fomento à formação, com projetos importantes como Palco Giratório, ArteSesc, BiblioSesc, Cinesesc, Prêmio Sesc de Literatura, Revista Palavra, Sonora Brasil, Sesc Partitura, além do Centro de Pesquisa e Formação do Sesc, com cursos nas áreas de Educação, Cultura, Arte, Gestão e Mediação Culturais. Então, seria um crime acabar com tudo isso.
Deixei por último para comentar da experiência de voltar ao palco e, como falei, estou muito feliz. Todavia o melhor mesmo foi voltar ao lado de músicos jovens, modernos e talentosos. Alisson Coutto é o capitão da Nau. Esse menino, que poderia nascer em outro lugar qualquer do planeta, nasceu na Atalaia Nova. Filho de uma amiga da juventude, tem na cabeça o mundo. E no coração, a paixão pela música universal e pela Cultura da sua terra. Querido amigo, que confio e respeito, ele me apresentou a Coutto Orquestra e foi um casamento perfeito. A empatia foi imediata. Alberto Silveira, que músico! Ouvia falar muito bem dele, mas era pouco. O rapaz é melhor que tudo o que já ouvi, Ótimo músico, simples, gentil e generoso.
Ouvi dele a seguinte frase: – Você pode não ganhar o festival, contudo ganhou meu coração. Mas, eu já tinha vencido o festival só por tocar, conviver com eles e aprender muito. Esse foi o meu grande prêmio. Odílio Saminez, na Bateria, segurança e simplicidade. Só me deixou confortável. Denyson Tubinha, o moço dos contracantos, com seu trompete mágico. E claro, o meu convidado especial, Júlio Rego, que é o gênio das gaitas.
Tenho uma história interessante com Julinho. Ele adorava e só tocava Blues, Jazz, MPB e músicas instrumentais. Eu sempre via, em alguns shows, as performances dele. E um dia, convidei para tocar em um forró do Bando de Mulheres. Uma gaita no Forró. Ele espantouse e disse que não combinava. Eu insisti e ele foi. Gostou tanto que não largou mais a música nordestina e tradicional. Julinho é um querubim, um humano como poucos e um músico único. Agradeço o presente de poder estar no mesmo palco com todos eles. A final do Sescanção foi uma noite que demonstrou uma parcela da música sergipana desse tempo e que fica registrado para todo o sempre.
* É Cantor, Compositor, Publicitário e Gestor Cultural