Acostumados a madrugar, os pescadores da Barra dos Coqueiros, município da Grande Aracaju perceberam antes de o sol aparecer que havia algo estranho e assustador na praia naquele 30 de agosto de 2019. Manchas de óleo se espalhavam em vários pontos da faixa de areia. Nem sabiam ainda que aquele era apenas o cartão de visita de um dos maiores desastres ambientais da história do Brasil.
O vazamento de óleo que atingiu toda a costa do Nordeste e os litorais de Espírito Santo e Rio de Janeiro, na região Sudeste, tem, dois anos depois, causa ainda indefinida e prejuízos incalculáveis. Uma investigação da Marinha encerrada no ano passado apontou que o petróleo é venezuelano, mas não soube precisar de onde ele estava. Três navios foram apontados como suspeitos. O inquérito da Polícia Federal sobre o caso não foi concluído e segue em segredo de Justiça.
Nos três meses que duraram a tragédia, cerca de mil praias do país foram sujas pelo óleo, que ia e voltava sem aviso prévio. Até dezembro de 2019, quando a situação ficou próxima do normal, cinco mil toneladas desses materiais grudados em areia e outras substâncias haviam sido retiradas da natureza. Em algumas das principais paisagens nacionais é comum pelotas pretas reaparecerem até hoje.
Erro repetido
O biólogo e doutor em ecologia Gilberto Rodrigues, professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), explica que parte desse retorno se dá porque se repetiu no país um erro cometido em várias praias. “Foi feita a limpeza, mas o descarte do produto ocorreu em áreas impróprias. Com a época de chuva, junho, julho e agosto, esse lixo mal descartado volta para o mar e acaba nas areias”, explica.
Em relação às espécies do mar, a conta do desastre deve demorar mais um pouco a chegar, afirma o professor do departamento de Engenharia Ambiental da Escola Politécnica da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Ícaro Moreira. “A gente tem observado na região a diminuição da pesca de lambretas [molusco que se encontra dentro de conchas], que estão aparecendo bem menos que antes”, observa o biólogo. “Outros animais talvez demorem mais para mostrar o efeito que teve o petróleo, até porque a substância continua na natureza contaminando os pescados.”
A tragédia humana
O drama ambiental ainda não teve tempo de ser calculado, mas só não viu quem não quis o dos 400 mil pescadores que ficaram sem renda em todo o país. Afinal, ninguém mais queria comer nada de um mar contaminado. “De uma hora para outra, todos pararam de comprar peixes e frutos do mar. E quando os pescadores começavam a se recuperar, veio a pandemia de covid-19, com impacto negativo importante no turismo e na pesca. Com certeza é o público que mais sofreu nesses dois anos”, acredita Ícaro Moreira.