Protagonista do movimento de afastamento do ex-presidente Fernando Collor e apoiador do processo contra a ex-presidente Dilma Rousseff, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ainda se divide sobre um eventual pedido de impeachment de Jair Bolsonaro. Relatório concluído semana passada pela comissão especial de juristas da OAB, grupo liderado pelo ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Carlos Ayres Britto, recomendou à entidade que peça à Câmara o impedimento do presidente com base em uma série de crimes gravíssimos atribuídos a ele.
O assunto, porém, causa controvérsia no Conselho Federal e está longe de ser definido. Há conselheiros e ex-presidentes contrários à apresentação de qualquer pedido de afastamento de Bolsonaro, seja por compartilharem de suas visões, seja por entenderem que ele não cometeu crime, seja por considerarem o momento turbulento demais por causa da pandemia. Outros defendem que o relatório seja examinado imediatamente, por já reunir elementos técnicos, e encaminhado para que a Câmara decida o que fazer. E há um grupo que entende que o pedido de abertura do processo, a despeito de reunir as condições técnicas, precisa ser apresentado quando estiverem dadas as condições políticas no Congresso.
O relatório, elaborado por uma espécie de comitê de notáveis, é contundente: atribui a Bolsonaro os crimes de homicídio e lesão corporal por omissão e crimes de responsabilidade na esfera nacional, por causa do enfrentamento da pandemia; e de crime contra a humanidade, no plano internacional. Acusações nunca reunidas em um pedido de impeachment contra um presidente da República no Brasil.
“O presidente não somente descumpriu o seu dever de zelar pela saúde pública, como também tentou sistematicamente impedir que medidas adequadas ao combate da covid-19 fossem tomadas. Há vários exemplos de tentativa de interrupção de cursos causais salvadores empreendidos por outras autoridades”, diz trecho do documento (veja a íntegra).
Mudança de humor
Para Cezar Britto, que presidiu a OAB entre 2007 e 2010, ainda é difícil avaliar qual o posicionamento predominante entre os conselheiros federais hoje. “O tema do impeachment nos força a decidir. Alguma posição é preciso ter. Acho que a OAB tem se posicionado externamente muito bem no acompanhamento do governo. O Felipe Santa Cruz tem se posicionado corretamente no combate aos abusos do governo. A Ordem está honrando sua tradição de defender a Constituição e o Estado de direito”, afirma Cezar, que já apresentou na condição de advogado e integrante da sociedade civil dois pedidos de impeachment à Câmara contra Bolsonaro.
Na avaliação de Cezar Britto, a lista de crimes cometidos por Bolsonaro é farta e as condições políticas começam a surgir para o impeachment. “O governo insiste no negacionismo da pandemia. Há uma perda de apoio do empresariado; uma fragilização na relação do presidente com os militares e dos militares com a sociedade; há uma perda de popularidade na sociedade; há um descompasso do governo em sua política externa e ambiental, o que prejudica o agronegócio, base apoiadora de Bolsonaro; e o fato de o vice-presidente [Hamilton Mourão] ser da confiança dessas bases com as quais ele rompeu”, afirma.
Efeitos da pandemia
Felipe Santa Cruz diz que o Conselho Federal da OAB entende que um processo de impeachment deve ser usado como exceção e não como regra, por criar fissuras e traumas na sociedade, e que a pandemia impede a movimentação popular nas ruas, o que torna o cenário mais favorável ao presidente. “Hoje o governo tem uma base parlamentar no Congresso. A sociedade está tomada por outras questões, como a sobrevivência, o trabalho, o medo, o luto, as pessoas estão perdendo amigos e familiares”, observa.
Para ele, a CPI pode ser fato novo conforme as revelações que produzir. “A CPI vai verificar a ocorrência ou não dessa condução equivocada e infeliz do governo brasileiro. Virou unanimidade no mundo todo, que trata o Brasil como o pior modelo de enfrentamento à pandemia. Esse quadro político se altera com muita rapidez. Há muita insatisfação. Cabe a nós continuarmos esse debate jurídico, que vamos fazer com o maior cuidado possível, respeitando todo o direito à defesa, ao contraditório”, diz o presidente da OAB.
Fonte: Congresso em Foco
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não está dividida , a oab que pediu o impeatchement da Dilma inocente duas vezes é pró Bolsonaro, em sua maioria e em seu cerne.