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Praça Fausto Cardoso volta a respirar democracia

Marcos Cardoso*

Foi no mesmo lugar onde Lula fez um pequeno comício na quinta-feira, naquele canto da Praça Fausto Cardoso, que há 38 anos, em 26 de fevereiro de 1984, um dia de domingo, aconteceu em Aracaju o histórico comício das Diretas Já! O projeto de eleições livres para presidente da República não passaria na Câmara dos Deputados, mas o movimento que encheu o Brasil de esperança e clamava pela volta da democracia acabaria por jogar a pá de cal na ditadura militar, moribunda após 20 anos. O anacrônico regime seria sepultado no ano seguinte.

O líder operário e outros grandes da luta pela liberdade estavam presentes no dia histórico. Passados tantos anos de amadurecimento e aperfeiçoamento da democracia, o ex-presidente Lula hoje incorpora o desejo da maioria que se opõe ao presidente saudosista da ditadura e da tortura. Lutava-se contra um regime de ditadores, agora a luta é contra alguém que, nunca escondeu, gostaria de ser um ditador.

“A massa acorreu à Praça Fausto Cardoso e, segundo cálculos divulgados pela imprensa, cerca de 30 mil pessoas ouviram por quatro horas 21 oradores, entre os quais as grandes estrelas nacionais da campanha das Diretas” — Tancredo Neves, Ulysses Guimarães, Leonel Brizola, Fernando Henrique Cardoso, Teotônio Vilela, o próprio Luiz Inácio Lula da Silva e Dante de Oliveira, deputado e futuro governador de Mato Grosso, autor da proposta de Emenda Constitucional número 5, de 2 de março de 1983, que propunha eleição direta para a Presidência da República. Assim registrou o professor e cientista político Ibarê Dantas, no livro “A Tutela Militar em Sergipe – 1964/1984”.

“Desde o início dos anos sessenta não se via em terras de Sergipe comício naquelas proporções”, lembrou Ibarê. O movimento que contagiou o Brasil proporcionou em Aracaju uma das páginas mais extraordinárias da história política sergipana.

Em 21 de janeiro de 1984, foi lançado no velho prédio da Assembleia Legislativa, bem em frente ao local dos comícios, de ontem e de agora, o Comitê Pró-Diretas, com a presença de 500 pessoas, reunindo não apenas os principais nomes jovens da esquerda sergipana — dentre os quais, Marcelo Déda e Edvaldo Nogueira — pertencentes a todos os partidos oposicionistas do Estado, “mas, também, para surpresa geral, o deputado Walter Franco, do PDS”, como sublinhou o cientista político. No passado, assim como agora, era necessário reunir do mesmo lado quem lutava pela democracia.

Mais votado com quase 30 mil votos, o empresário havia sido eleito deputado estadual dois anos antes e militava no partido governista. Mas, ao contrário do que propugnavam os militares e os que os apoiavam, tinha consciência da importância da restauração democrática, com eleições livres e diretas para presidente da República e nas capitais.

“Embora o coordenador da campanha Pró-Diretas em Sergipe fosse Jackson Barreto, adversário dos Franco, o deputado Walter Franco foi dos que mais colaboraram financeiramente para a realização do evento. Além de sua ajuda pessoal, conta-se até que teria feito campanha, ao lado dos oposicionistas, no sentido de arrecadar fundos junto a empresários”, registrou Ibarê Dantas, acrescentando que o então prefeito de Aracaju, Heráclito Guimarães Rollemberg, teria, a pedido do comitê Pró-Diretas, instalado o palanque e o sistema de som para o comício na Praça Fausto Cardoso.

No mundo democrático tudo parece simples, mas naquele quadrante da história realizar um comício daquele porte e com aquele apelo político exigia uma boa dose de coragem e resistência. Apesar de todos os meios de comunicação locais virem cobrindo os encontros, que em Sergipe também se realizaram em Propriá, Lagarto, Itabaiana, Simão Dias, Tobias Barreto e Estância, quando chegou a vez do comício de Aracaju as restrições afloraram.

“O Dentel em Sergipe ‘aconselhou as emissoras que evitassem as notícias sobre as manifestações Pró-Diretas’ (segundo publicou o Jornal de Sergipe, na véspera do evento). O senador Lourival Baptista teria declarado que era a favor das eleições diretas, mas não naquele momento, quando o povo estava desorganizado e despreparado. José Carlos Teixeira, embora participasse do movimento no plano nacional, esteve ausente. Indisposto com seus correligionários Jackson Barreto e Nélson Araújo, deixou-os comandar o partido (PMDB) e assistiu, de longe, a eles se projetarem com o movimento cívico das Diretas”, escreveu Ibarê.

Apesar da pressão popular, a proposta foi derrotada na sessão do dia 25 de abril de 1984, na verdade, já madrugada do dia 26. Para que o texto fosse aprovado, era necessário o voto favorável de dois terços da Câmara Federal, ou 320 deputados. Com 298 votos a favor, 65 contrários, três abstenções e a ausência de 113 deputados, a emenda foi rejeitada. Faltaram 22 votos.

Três deputados sergipanos, os oposicionistas José Carlos Teixeira e Jackson Barreto e o situacionista Gilton Garcia, votaram a favor da emenda. Foram derrotados, mas seus nomes estão marcados na história como vencedores da luta pela democracia. A semente estava plantada e o regime imposto à força estava mais enfraquecido do que nunca. A derrota na Câmara encerrou uma campanha popular vitoriosa e que mudou a história do Brasil.

A esperança sempre vence o medo.

*É jornalista

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1 Comments

  1. Rita Barbosa Sousa disse:

    Excelente texto ! Detalhou o.momento histórico das diretas , quando acompanhei e torci muito pela vitória. A democracia hoje se fortalece com as multidões saudando Lula na Bahia, em Sergipe, Recife. E vitória ✌️ na certa!

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