Angelo Roberto Antoniolli*
A vida segue o seu rumo, traçado pelas próprias contingências do tempo, sem determinismos. Temos vivido momentos de angústias, sobressaltos, ansiedade, mas, também, de esperança, no mundo inteiro, em face da pandemia, que, desde o início do ano passado, assola e amedronta a humanidade.
No Brasil, há muito a ser feito, no caso do combate à pandemia. Tem havido desencontros. E mortes em números lamentavelmente alarmantes. Em Sergipe, não haveria de ser diferente. Entre nós, da Universidade Federal de Sergipe, alguns têm tombado nos últimos meses. Professores e técnicos administrativos. Aposentados ou não. A nossa família vai sendo desfalcada. A cada um (a) que se vai, é um pedaço da UFS que também se vai. É um pedaço de cada um de nós, que dela fazemos parte.
Todavia, não é só a Covid-19 que nos despedaça. A morte tem nos cobrado o seu tributo por outras causas também. No último sábado, 13, faleceu o eminente professor e acadêmico Clodoaldo de Alencar Filho, que foi reitor da UFS, de 1988 a 1992, no período logo após a queda do regime militar (1964-1985). Aliás, tivemos a honra de homenageá-lo no ensejo das comemorações dos 50 anos da nossa tão querida UFS. Foi, sem dúvida, um momento de emoção e júbilo.
Nascido em Estância, Alencar era formado em Letras/Inglês, pela Faculdade Católica de Filosofia, que seria incorporada à UFS, na sua fundação, e nos deixou aos 88 anos. Do casamento com a igualmente professora e acadêmica Aglaé D’Ávila Fontes, atual presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, deixa os filhos Del Alencar e Jean Marcel.
O professor Clodoaldo foi um ativista cultural dentre os maiores de Sergipe. Um homem multifacetado por tudo que fez na seara da educação e da cultura. A família Alencar, em Sergipe, a partir do patriarca, Clodoaldo de Alencar, renomado poeta, deixou um rastro luminoso. Quatro varões, o pai e três filhos (Alencar Filho, Luiz Carlos e Hunald) pertenceram à Academia Sergipana de Letras. O outro irmão, Leonardo, artista plástico, pertenceu ao Movimento de Apoio Cultural Antônio Garcia Filho da mesma Academia.
Alencar deu mais vida às funções que exerceu. Teve presença marcante por onde passou. Na Rádio Cultura de Sergipe, da Igreja Católica, no tempo de Dom José Vicente Távora, primeiro arcebispo de Aracaju, foi um diretor artístico inovador e criativo. Uma época de ouro para a emissora, no plano cultural. Promoveu eventos que sacudiram a sociedade aracajuana. Na Prefeitura de Aracaju, auxiliou o prefeito Godofredo Diniz (1963-1967), na área da cultura, sendo o idealizador da Galeria de Arte Álvaro Santos. Teve atuação importante no teatro e na imprensa escrita. Publicou os livros “As intemporais” e “Caleidoscópio”.
Na Universidade Federal de Sergipe, Alencar tornou-se um ícone nas salas de aula, admirado e respeitado pelos alunos e colegas. No CECAC – Centro de Extensão Cultural e Assuntos Comunitários, o seu desempenho foi inesquecível, a exemplo de sua atuação na dinamização do Festival de Arte de São Cristóvão. Foi pró-reitor de Extensão e, mais tarde, vice-reitor na gestão de Eduardo Conde Garcia (1984-1988), sucedendo-o.
Ao chegar à reitoria da UFS, Alencar Filho deu oportunidade a jovens professores e técnicos administrativos, agregando-os à sua gestão. Era um homem de temperamento afável, calmo, vivaz, bem humorado, que sabia como receber as pessoas com cordialidade, por mais exaltadas que elas estivessem.
Na administração da UFS, Alencar procurou melhorar a qualidade do ensino e internacionalizar as relações da Universidade, compreendendo, pois, o alcance da globalização nos processos educativos. Criou novos cursos de graduação, desenvolveu promoções de natureza cultural no campo das artes plásticas, cinema sergipano, música erudita, além de incrementar, ainda mais, o Festival de Arte de São Cristóvão. Por ele foi criado o Núcleo de Assuntos Internacionais e construída a sede do CODAP – Colégio de Aplicação.
Devemos ser gratos ao professor Clodoaldo de Alencar Filho por tudo o que ele fez pela UFS e por Sergipe. Que nunca o possamos esquecer. Que Sergipe siga em frente. E que a UFS reencontre o caminho da normalidade, inspirando-se na força produtiva do saudoso mestre.
*Professor e ex-reitor da UFS