As aulas retornaram e com ela há um debate profundo sobre sua pertinência: será que iniciou em boa hora? Independentemente dos caminhos que essa discussão leve, a realidade é que muitas escolas estão abertas e preocupadas com os protocolos de segurança: máscaras, distanciamento social, álcool em gel, aferição de temperatura.
De acordo com a psicóloga Milena Aragão, mestre e doutora em Educação, na esteira dessas preocupações, é preciso olhar com atenção para a proteção emocional das crianças. “Os protocolos de prevenção contra a COVID – 19 são indispensáveis, mas o acolhimento emocional é imprescindível para que esse retorno respeite a saúde mental das crianças”, enfatiza.
Milena ressalta que neste contexto, a retomada das aulas mobiliza algumas questões importantes. A primeira é sobre o medo de se contaminar. “Ouvimos e lemos discursos sobre o temor da abertura das escolas e a contaminação das crianças. Com isso, é possível encontrar na voz de estudantes, o medo de contaminar a família ao retornar para casa. Esse medo precisa ser acolhido e conversado, pois ele influencia negativamente o comportamento e desempenho escolar”, orienta.
Profusão de emoções
Outro ponto importante diz respeito ao luto. “Há crianças e famílias que perderam entes queridos. Esse luto gera uma profusão de emoções e sentimentos como tristeza, raiva, culpa, ansiedade, saudade, medo, além de fadiga mental, os quais as crianças levam para a sala de aula e podem converter-se em desafios de comportamento. Como a escola e família tem acolhido essa realidade?”, questiona a psicóloga.
A mudança na rotina e expectativas é outra condição que merece atenção, segundo a psicóloga. “Os estudantes tiveram que se adaptar (mesmo com dificuldade) a uma rotina de estudos e convivência em casa. O recomeço das aulas presenciais mobilizou na criança a expectativa de que “tudo seria como antes”, o que não ocorreu, gerando frustrações difíceis de lidar. Concomitante, houve uma reorganização na autorregulação e rotina infantil, a qual pode gerar ansiedade e confusão, também impactando o comportamento e o desempenho escolar”, aponta Milena Aragão.
De acordo com ela, se o argumento primordial que fundamenta o retorno às aulas presenciais é o bem-estar da criança, então escola e família devem se unir em um grande projeto de educação emocional, que envolvam acolhimento, validação dos sentimentos, construção de atividades de socialização segura e redução da ansiedade.
“É urgente a revisão das expectativas com relação aos conteúdos planejados, afinal uma rotina de estudos intensa, com pouco espaço para a elaboração dos desafios emocionais enfrentados no ano anterior (e ainda neste 2021), pode contribuir para o aumento da ansiedade nos estudantes. Sabemos o quanto emoções e sentimentos não elaborados convertem-se em comportamentos desafiadores e impacto no desempenho em classe”, ensina.
Professores tensos
Os professores, por sua vez, também estão tensos, restritos a um espaço de ação que não lhes é familiar, não nesses moldes, e no entendimento da psicóloga, também precisam de apoio. De acordo com Milena Aragão, é preciso investir na educação emocional, em detrimento de punições, cobranças e exigências. Além disso, organizar uma “hora do recreio” de qualidade, uma vez que ele tem como função prevenir a fadiga e o esgotamento mental, desenvolver habilidades sociais, melhorar a disciplina em classe e reduzir o stress, em especial gerado pelas mudanças que as crianças vivenciam.
“Uma delas é o próprio retorno às aulas. Uso constante de máscara, não socializar tranquilamente com os colegas e atentar para uma série de restrições que dizem ‘essa escola não é a mais a mesma’. Isso tem gerado tensão. Assim, para o recreio ser um ótimo aliado, abuse da ludicidade, musicalidade e atividades corporais. Há muitas adaptações possíveis de serem feitas, como por exemplo, organizar uma “roda inicial” onde as crianças – por alguns minutos- possam falar sobre o que sentem e pensam”, afirma Milena.
Por fim, a psicóloga ressalta a importância da construção de espaços seguros de escuta e acolhimento aos docentes. “Cada escola tem uma realidade contextual e os projetos devem respeitá-la, contudo, nesse cenário atípico, todos precisam dar as mãos e acolher empaticamente uns aos outros. A união tem se mostrado o único caminho para seguirmos de forma a proporcionar uma transformação positiva e segura, em nós individualmente e na sociedade como um todo”, finaliza.
Fonte e foto: Assessoria de Imprensa